(Revista Pergunte e Responderemos, PR 003/1957)
De modo geral, denomina-se alma o princípio vital que anima ou faz viver a matéria orgânica. Embora não se saiba definir exatamente em que consiste a vida, costuma-se dizer que é auto-moção ou “moção de si mesmo”. Distinguem-se três graus de vida:
– a vida meramente vegetativa, cujas funções são nutrimento, crescimento e multiplicação da espécie;
– a vida sensitiva, que, além das funções anteriores, possui a faculdade de conhecer, mediante os sentidos (órgãos do corpo), objetos concretos, dotados de tamanho, cor, sabor, sonoridade, etc. ; só atinge objetos dimensionais;
– a vida intelectiva, que tem, a mais, a função de elaborar noções abstraías, depuradas das dimensões e outras notas concretas, contingentes, com que os seres aparecem na natureza ; a inteligência, por exemplo, elaborando os dados recebidos pelos sentidos, chega à conclusão de que o «homem» não é somente Pedro, Paulo, João…, mas todo vivente (branco ou negro, alto ou baixo, masculino ou feminino) capaz de raciocinar ou racional. Um dos sinais mais característicos da presença do intelecto ou da vida intelectiva num determinado sujeito é a faculdade de falar, a qual supõe sempre um poder superior aos sentidos, coordenador das impressões recebidas por estes («se o chimpanzé tem a possibilidade de falar, mas na realidade não fala, entenda-se que a função de falar, em sua essência, não é função orgânica, mas função intelectual e espiritual», G. Gusdorf, La Parole. Paris 1953,4). Outra característica do ser intelectivo é o riso, que supõe a admiração, ou seja, o conhecimento abstrativo e lento que se faz por meio do raciocínio.
Na base desta tríplice distinção, fala-se de alma (princípio vital) vegetativa, alma sensitiva e alma intelectiva.
Cada indivíduo possui uma alma só, que satisfaz a todas as funções de sua vida.
A alma intelectiva é própria do homem. Difere da vegetativa e da sensitiva pelo fato de que, como acima dissemos, estas não têm funções que transcendam os limites da matéria; são materiais; por isto são produzidas pela potencialidade mesma da matéria e reabsorvidas por esta, quando cessam as disposições do corpo necessárias para que exerçam suas funções. A alma intelectiva, ao contrário, possui atividade superior à do corpo; é capaz de conhecer o que não cai diretamente sob os sentidos (embora se sirva do conhecimento sensitivo como de base das suas elucubrações); conhece, por exemplo, a causa invisível de um efeito visível, as relações entre os meios e determinado fim, aquilo que é essencial e perene em indivíduos diversificados por notas contingentes, etc. Por isto a alma humana não é material, mas «espiritual» (o modo de ser e o modo de agir de um indivíduo são estritamente correlativos entre si); o que mais precisamente significa: ela não tem extensão, nem tamanho, nem cor, nem sabor, nem figura, sem que por isto deixe de ser muito real (Deus também não tem figura nem cor). Daqui se segue, como melhor se dirá abaixo (nº. 2) que a alma humana tem origem independente da matéria e pode subsistir fora ou independentemente desta.
Dada a transcendência da alma humana em relação à da planta e à do animal irracional, costuma-se reservar o nome alma para o que concerne ao homem, chamando-se simplesmente princípio vital (vegetativo ou sensitivo) o elemento que vivifica as plantas e os irracionais.