(Revista Pergunte e Responderemos, PR 251/1980)
Em síntese: A ciência de nossos dias oferece ao homem dados experimentais de precisão singular, até nunca atingida,… dados mediante os quais os pensadores podem tentar construir a sua cosmovisão ou Weltanschauung. Ora a ciência contemporânea se torna cada vez mais consciente da presença de uma Inteligência Suprema que preside à evolução das criaturas; de modo especial, o ser vivo é o espécimen mais significativo da sabedoria do Senhor Deus Criador. O presente artigo aponta vários aspectos da realidade dos viventes (anatomia, fisiologia, embriogênese… ), que atestam a existência de um modelo regulador das funções de cada célula viva, modelo que garante a evolução finalista dos viventes e a sua tendência a se reconstruir quando lesados; este modelo é obra e expressão da sabedoria do Supremo Artífice. Tais elementos, descobertos e afirmados pela ciência contemporânea, opõem-se às concepções mecanicistas e afinalistas dos cientistas do século XIX ou mesmo da escola neopositivista representada no século XX por Jacques Monod; confirmam outrossim a existência de Deus, sempre professada por sábios, mas posta em xeque pelos materialistas do século passado, cuja ciência ainda era relativamente incipiente. Mais uma vez se comprova que a pouca ciência afasta de Deus, mas a muita ciência leva a Deus.
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Comentário: Em todas as épocas os homens procuravam ter uma Weltanschauung ou visão global do mundo e do homem. Para tanto, costumam partir dos dados da ciência da sua época. Ora nos últimos decênios a ciência progrediu enormemente, adquirindo algumas certezas de grande importância. Tenha-se em vista, por exemplo, o fato de que os homens construíram uma nave espacial, foram à Lua e de lá voltaram à Terra; este fenômeno significa que os conceitos vigentes de estrutura da matéria, das leis que a regem e das que comandam as transformações da energia e a atração dos corpos, correspondem, em grande escala, à realidade, pois, apoiando-se em tais leis, os homens realizaram a viagem à Lua. Note-se outrossim que o fato de que a medicina consegue a profilaxia e a cura de doenças cada vez mais numerosas, comprova os conhecimentos adquiridos na área biomédica.
Eis por que, nas páginas subseqüentes, nos baseamos em dados da ciência de nossos dias, escolhendo, em especial, a biologia contemporânea, para propor um princípio de cosmovisão que será muito diferente da filosofia materialista de decênios passados; com efeito, apontará a existência de Deus como algo que decorre da observação objetiva do fenômeno “vida” e ilustra todos os demais conhecimentos do homem.
Consideraremos 1) traços característicos do ser vivo; 2 ) a embriogênese; 3) a explicação mecanicista da vida. Ao quê se seguirá uma conclusão.
1 . O ser vivo – elementos característicos
Dentre os viventes, seja o homem selecionado para uma análise mais detida. Consideremo-lo em três níveis diferentes: o da célula, o do órgão e o do organismo.
1.1 . A célula humana
A célula é uma unidade que, observada ao miscroscópio eletrônico, revela estrutura e atividade complexas, mas cheias de sentido.
A parede da célula isola esta das suas vizinhas e a põe em comunicação com as mesmas e com o meio ambiente. Permite intercâmbios dirigidos e controlados com precisão num sentido e noutro.
O citoplasma ou massa liquida da célula é sede de atividades químicas extremamente requintadas e de extraordinária complexidade: graças aos elementos recebidos de fora, elabora as substâncias e as energias necessárias à conservação das suas estruturas e ao funcionamento do organismo. Todas estas operações se realizam com exatidão, harmonia e capacidade de adaptação surpreendentes.
Quanto ao núcleo da célula, contém a cromatina, cujo componente mais importante é o ácido desoxiribonucléico ou ADN, suporte das informações cujo conjunto constitui o programa genético. Este se acha inscrito, segundo um código que começa a ser decifrado, sobre a longa fita que é o ADN, comparável a uma fita magnética; dirige soberanamente todas as atividades da célula. Por ocasião de cada divisão de célula, as informações são copiadas pelo desdobramento da fita de ADN e transmitidas integralmente às células-filhas.
1. 2. A nível de órgão
Especializadas e diferenciadas, as células microscópicas se agrupam em centenas de milhões para formar conjuntos macroscópicos de forma e volume bem definidos, como o fígado, o coração e o cérebro, etc. As células do fígado põem em reserva produtos energéticos trazidos pelo sangue e liberam-nos segundo as necessidades precisas do organismo a cada momento. Segregam diástases,eliminam dejetos, neutralizam toxinas. As células do coração estão agrupadas de modo a formar uma bomba que aspira e preme, com as suas cavidades, as suas válvulas e os seus canais… ; são muito alongadas; o seu citoplasma contém um sem número de pequenas fibras paralelas, que funcionam em ritmo rigoroso e em estrita sincronia, de modo a provocar as contrações do coração; esta bomba, que é o coração, preenche a sua tarefa segundo por segundo durante toda a vida do organismo.
No tocante ao cérebro, note-se que é uma estrutura formada por mais de dez bilhões de células, cada uma das quais está ligada a muitas outras por várias dezenas de milhares de conexões. Entre os seres visíveis, o cérebro humano é o mais prodigioso, pois vem a ser o suporte material e o instrumento cuja integridade é indispensável ao exercício do pensamento.
1. 3.A nível de organismo
Os diversos órgãos, associados aos ossos, aos nervos, aos músculos, à pele… estão integrados numa unidade maior que é o organismo, rico em atividades físicas e psíquicas, e que se reproduz para dar origem a organismos semelhantes, que lhe farão as vezes e lhe darão continuidade após a morte.
A reprodução genética, que permite aos viventes perdurar através do tempo, chama-nos a atenção para o fato de que o indivíduo está integrado numa unidade muito maior que é a espécie, a qual por sua vez está integrada no conjunto das espécies que hoje existem e, por último, na árvore da vida. Esta é constituída por numerosíssimas espécies que, procedendo da primeira bactéria, se escalonam em graus ascendentes, tornando-se cada vez mais complexas e perfeitas até chegar ao organismo do primata mais evoluído; a este Deus quis infundir uma alma espiritual criada especialmente para tal organismo, dando assim origem ao composto humano ou à espécie humana .O processo que vai da bactéria ao surto do tipo humano conta aproximadamente três bilhões e meio de anos.
2. A embriogênese
1. Todo ser vivo se desenvolve a partir de uma célula única, a célula-ovo, oriunda da fusão de duas células reprodutoras: uma do pai, outra da mãe.. . A célula-ovo, microscópica, divide-se em 2, 4, 8, 16… etc. Forma-se rapidamente um aglomerado de células indiferenciadas, que continuam a se dividir e, com o tempo, se vão diferenciando, de modo a constituir progressiva e harmoniosamente todos os órgãos e todas as partes de um novo organismo, num processo que, no caso do homem, chega a termo em nove meses.
Os estudiosos se dedicaram particularmente ao estudo do ovo da galinha, que é mais facilmente observável e que pode ser objeto de intervenções experimentais. O ovo consta de reservas de duas espécies – a clara e a gema – e da célula-ovo microscópica, situada sobre a membrana que separa clara e gema. Colocado o ovo sob o corpo da galinha-mãe ou numa incubadeira, a célula-ovo se divide e subdivide, utilizando as reservas da clara e da gema; ao termo de vinte e um dias, está assim formado o pinto vivo. Este rompe então a casca do ovo e sai, capaz de ver, ouvir, mover-se, alimentar-se e emitir sons que têm significado para a galinha e para o próprio observador humano. Com efeito, quando se afasta da galinha-mãe e verifica que está só, o pinto põe-se a piar de maneira aguda, intensa e prolongada. Desde que a galinha-mãe o procure, o pintinho emite sons menos intensos e de outro ritmo, que significam apaziguamento e segurança. Vê-se assim que o pintinho é dotado de instintos cujas expressões são diversificadas e características. – A transição da célula-ovo ao pinto é portanto típico da embriogênese.
2. Examinemos agora alguns aspectos típicos dessa transição.
No conjunto das células originadas pelas primeiras divisões da célula-ovo, podem-se distinguir regiões, que se chamam esboços, dos quais cada um tem sua finalidade própria. Evoluirão de modo a produzir os diferentes órgãos que integram o corpo: coração, fígado, aparelho digestivo, ossos, músculos, etc. Cada uma dessa zonas é regida por um modelo local, que lhe é próprio. É o que verificamos quando, a título de experiência, extraímos do embrião a massa de 1 ou 2 mm de diâmetro correspondente ao esboço ou à zona do fêmur; coloquemos essa massa num tubo de ensaio dentro de um liquido alimentício artificial. Observaremos então que o esboço continuará a crescer e se transformará em um pequeno fêmur bem constituído de 10 a 15 mm de comprimento, com a sua diáfise e as suas duas epífises.
No embrião, os diversos esboços se desenvolvem influenciando-se e informando-se mutuamente para formar aos poucos e em perfeita coordenação o conjunto maravilhoso que é o pinto vivo. Se no início do desenvolvimento do embrião amputarmos parte de uma região-esboço ou mesmo uma região inteira, outros conjuntos de células já orientadas para determinado objetivo mudarão de orientação ou se desdobrarão para solucionar a perturbação criada pela intervenção do operador. Em conseqüência, apesar dos distúrbios causados no embrião, um pintinho perfeito poderá sair do ovo: com efeito, o embrião é capaz de auto-regulação. Deste fenômeno se conclui que os modelos reguladores locais gozam de certa autonomia, mas estão subordinados hierarquicamente a um modelo regulador geral, que dirige e coordena as atividades parciais e locais e que é capaz de identificar e de suprir “inteligentemente” as falhas de um acidente imprevisto.
Notemos ainda que todo o desenrolar da embriogênese está programado sobre a fita de ADN do núcleo da célula-ovo no caso do pintinho como no de qualquer vivente; essa programação, aliás, persiste no vivente de modo a presidir a toda a evolução biológica do mesmo na sua vida de adulto até a morte.
3.A explicação mecanicista da vida
A ciência do século XIX sugeriu a não poucos cientistas uma explicação mecanicista da vida e da origem da vida… explicação que Jacques Monod reiterou no seu livro “O acaso e a necessidade». Este autor admite, como não podia deixar de admitir, a existência de sentido e finalidade de “projeto” e “atividade projetiva” nos seres vivos. Mas acredita que essa projetividade ou programação procede do “não-senso” ou da não-projetividade inicial e fundamental do universo; ao acaso teriam aparecido, na massa inicial do universo, moléculas capazes de se reproduzir e de transmitir fielmente informações. Estas estariam inscritas no ADN dos cromossomos dos seres vivos e seriam suscetíveis de mudanças ocorrentes ao acaso e devidas a erros de acoplamento ou ao efeito de radiações; tais mudanças seriam chamadas, em linguagem técnica, “mutações”. Os indivíduos oriundos desses programas alterados teriam apresentado características que se transmitiram aos seus descendentes. Os indivíduos “mutantes” segundo Monod, sofreram a seleção natural: aqueles cujas mutações eram vantajosas para se adaptar às condições e circunstâncias do ambiente, subsistiram, reproduziram-se e, aos poucos, foram suplantando os indivíduos não adaptados ao ambiente.
Tal mecanismo, desenvolvendo-se durante centenas de milhões de anos, explicaria, segundo Monod, o aparecimento da vida e a evolução desta a partir da bactéria até o homem. Não teria havido nenhuma previsão, nenhum planejamento, nenhuma finalidade no universo antes do surto da vida por mero acaso. Por conseguinte, não haveria Inteligência Suprema Reguladora,… não haveria Deus.
A evolução mecanicista da vida e do setor da biologia, baseada unicamente sobre o acaso e as propriedades físico-químicas do ADN, nunca foi reconhecida unanimente como satisfatória. Não é de estranhar que precisamente os biólogos – os cientistas mais bem informados na matéria – tenham sido os mais enérgicos adversários da tese mecanicista;propuseram argumentos numerosos e irrefutáveis em contrário. Seja suficiente, neste contexto, chamar a atenção para o que há de inverossímil na explicação mecanicista de um olho, de um ouvido, de um pulmão ou de uma asa de animal. Teria sido necessário enorme número de mutações, todas orientadas no mesmo sentido e fortemente coordenadas para que o acaso, corrigido pela seleção, pudesse ser tido como causa única da origem desses órgãos. Já se calculou que, para produzir o mundo dos viventes como hoje ele existe, o acaso teria necessitado de muito mais tempo do que o comprovado pela ciência ou mesmo um tempo ainda mais longo do que o da duração do universo inteiro.
Aliás, não se deveria conceber o acaso como um sujeito ou como algo de subsistente (ainda que incapaz de explicar o surto do universo). O acaso é o nome que se dá ao cruzamento de duas ou mais causas bem definidas e orientadas que se encontram sem que o observador o pudesse prever ou o saiba explicar; cada qual das causas que se cruzam num fenômeno “casual”, tem sua razão de ser e sua finalidade precisas; apenas acontece então que o observador, colhido de surpresa, exprime a sua ignorância através do nome “acaso”. Donde se vê que “acaso” não é um sujeito próprio, mas é um nome que encobre e traduz a ignorância do observador.
Conscientes das verdades até aqui expostas, os biólogos mais sagazes sempre admitiram que a vida é regida por um dinamismo próprio que, sem dúvida, utiliza as forças físico-químicas, mas, ao mesmo tempo, as ultrapassa de maneira estupenda.
As observações até aqui propostas levam-nos a procurar uma:
4. Conclusão
Os cientistas contemporâneos têm-se voltado não só para os dados da biologia, mas também para os da microfísica e os da astrofísica e, a partir das mais recentes conclusões destas ciências, julgam poder e dever afirmar a existência de uma Inteligência Superior que concebeu o universo, lhe deu a existência e o conserva na sua realidade. Esta Inteligência se chama Deus; é a Fonte de todas as perfeições, porque é a própria Perfeição ou o Ser Perfeito, o Ser por excelência.
Tudo o que existe na natureza aponta para essa Inteligência, pois as criaturas dão testemunho da mesma. Quanto mais o homem sonda as riquezas das microestruturas e das macroesferas, tanto mais descobre os sinais e reflexos da Suma Sabedoria que as marcou com o seu sinete.
Em tal contexto da ciência moderna, torna-se impossível o materialismo e o ateísmo para quem tenha a mente livre de preconceitos. Verifíca-se assim, mais uma vez, que a pouca ciência pode afastar de Deus, mas a muita ciência leva a Deus.