Revista Pergunte e Responderemos, PR 464/2001)
Em síntese: A revista MEGAZINE (O GLOBO) publicou uma reportagem que investiga o conceito de pecados capitais entre adolescentes e jovens. Estariam defasados os sete pecados capitais clássicos em favor de sete outros, mais freqüentes na vida moderna. São interessantes as observações feitas pelos entrevistados; todavia não implicam que não se cometam em nossos dias os sete tradicionais pecados capitais.
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A revista MEGAZINE (O GLOBO), em sua edição de 12/9/00, pp. 16s, traz uma reportagem a respeito da noção de pecados capitais colhida entre adolescentes colegiais. O texto merece comentários.
Eis o que aí se lê:
“Você tem medo de cometer um dos sete pecados capitais? O que no passado já foi motivo de temor para muita gente hoje é assunto para discussões na escola. Será que a inveja, a luxúria, o orgulho, a ira, a avareza, a preguiça e a gula ainda são considerados pecados capitais hoje em dia? A pergunta andou nas cabeças e nas bocas dos alunos do Liceu Franco-Brasileiro, em Laranjeiras, durante uma semana. Depois de muito debate, a maioria concluiu que pecar é agir de um jeito que atrapalhe a própria vida ou a dos outros.
O debate movimentou o colégio e o resultado foi expresso em histórias em quadrinhos, esquetes teatrais e cartazes. Os participantes aprenderam que a etimologia da palavra pecado é errar o alvo e que a expressão capital é relativa à cabeça. Então, como a cabeça dos dias atuais erra o alvo? Para Tatiana Escovedo, de 16 anos, os pecados de hoje são muito diferentes dos do passado:
– Eu tinha medo de engordar e acabei com problema de anorexia. Isto pode ser considerado um pecado porque eu estava prejudicando a minha vida. Para mim, a exagerada preocupação com o corpo perfeito é um pecado mais importante hoje do que a gula.
Já Paulo Henrique Costa, de 17 anos, defende que o pecado como descreve a religião católica tem de ser reavaliado nos dias de hoje:
– Se você tem inveja de algum amigo e resolve correr atrás para conseguir o que ele tem, sem prejudicar ninguém, isto não pode ser considerado pecado.
Para Igor Sacramento, estudante do Liceu, de 16 anos, os pecados capitais foram criados pela Igreja Católica para impedir que o ser humano ultrapassasse alguns limites e principalmente os jovens têm dificuldade de aceitar isso.
– Nós temos a necessidade da transgressão e o pecado se transforma logo em tentação”.
REFLETINDO…
Como se vê, a mudança apresentada pelos adolescentes começa pelo próprio conceito de pecado, que seria tão somente um “prejudicar ou atrapalhar a própria vida e a dos outros”. Não se fala aí de Deus. Tem-se assim a secularização ou a laicização da noção de pecado. Tal concepção antropocêntrica está longe de corresponder à noção católica de pecado.
Donde a pergunta:
1. Pecado: que é?
1. O pecado é um Não dito a Deus.
A S. Escritura refere-se freqüentemente a esta atitude, apresentando-a como recusa do amor de Deus (cf. Is 1, 2-3) ou como violação da aliança com Deus, comparável ao adultério (cf. Jr 3, 20). É desobediência e ingratidão a Deus; cf. Gn 39, 2; 2Sm 12,13; Sl 51, 5; Lc 15,18.
O pecado é ofensa a Deus não porque faça Deus sofrer, mas porque viola a ordem estabelecida por Deus. Esta violação fere também o pecador, prejudicando-o gravemente, porque o priva do maior bem, que é a união com Deus. Por isto já diziam os filósofos gregos anteriores a Cristo: é melhor sofrer uma injúria do que cometer uma injúria; tal verdade reaparece em 1Pd 2, 19s.
Em todo pecado há sempre dois aspectos: a conversão indevida a uma criatura e a aversão frente a Deus. Geralmente o pecador só deseja explicitamente a primeira; não tenciona diretamente afastar-se de Deus, embora implicitamente perceba que o prazer indevido é incompatível com a união a Deus.
2. Como se vê, a noção de pecado se prende à noção de Deus. Ora esta atualmente vai-se apagando na consciência de muitos cristãos e não cristãos. Em conseqüência, também se verifica a perda da noção de pecado. Esta é pretensamente justificada a vários títulos:
1) o pecado (ou o comportamento errôneo) não seria mais do que sintoma de traumas recebidos por alguém na sua educação; por exemplo, se alguém é agressivo, isto seria conseqüência de falhas de educação. A pessoa no caso não seria culpada em consciência, nem precisaria pedir perdão a Deus, mas deveria recorrer a um tratamento psicanalítico, que a libertaria de seu complexo. Assim se poderia falar de “Moral sem pecado”.
2) O relativismo histórico também atenua a consciência de pecado, pois afirma que esta depende da cultura de cada época da história; assim o que outrora era tido como moralmente mau, hoje pode ser considerado virtude, e vice-versa.
3) Há quem diga que, se há pecado, este se volta não contra Deus, mas contra o homem, pois seria a recusa de tomar parte na luta contra a alienação econômica e social. Tal é a tese do marxismo.
Estas e outras posições semelhantes não se conciliam com a Moral católica. É plenamente verídica até hoje a palavra do Papa Pio XII: “O maior pecado dos nossos tempos é que os homens perderam o senso do pecado” (Discurso de 26/10/46).
2. Diversas modalidades de pecado
1 Distinguem-se pecado venial ou leve, pecado mortal ou grave e pecado contra o Espírito Santo.
1) O pecado contra o Espírito Santo (cf. Mt 12, 31; Mc 3, 28-30; Lc 12,10) é a recusa explícita do perdão e da graça de Deus. O Espírito Santo é o Mestre interior que nos atrai para o Pai; quem se fecha a Ele, coloca-se em situação irremediável, porque se recusa ao próprio remédio ou ao dom de Deus; Tal atitude também é chamada “pecado para a morte” (cf. ido 5, 16). É de notar, porém, o seguinte: qualquer pecador que se arrependa sinceramente e peça perdão a Deus, recebe o perdão.
2) O pecado mortal ou grave ocorre quando se preenchem três condições: a) matéria grave, importante; b) conhecimento de causa; c) vontade deliberada. É dito mortal porque, conforme a Escritura, leva à morte ou à perda da vida definitiva (cf. 1Jo 3,15; 1Cor 6, 9; Gl 5, 19s).
3) O pecado venial ou leve se dá quando falta um dos três requisitos acima. Não tira a vida da graça ou a filiação divina, mas contribui para torná-la anêmica.
Nem sempre é fácil ao cristão traçar a linha divisória entre pecado grave e pecado leve, pois a pessoa por vezes não pode definir até que ponto consentiu no pecado, nem sabe exatamente avaliar a importância da matéria em torno da qual pecou.
Entre o pecado venial e o mortal há enorme diferença. O conceito pleno de pecado só se aplica ao pecado mortal; este é realmente uma desobediência; o pecado venial pode coexistir com a orientação fundamental do cristão para Deus. Por isto também se compreende que muitos pecados veniais não chegam a constituir um pecado mortal; é certo, porém, que provocam um enfraquecimento da vontade e do amor a Deus, de modo que abrem o caminho para que a pessoa cometa um pecado mortal.
Para obter o perdão dos pecados mortais, o meio ordinário é o sacramento da Penitência.
Quanto aos pecados veniais, podem ser apagados por um ato de contrição ou por uma obra de caridade, mas a Igreja recomenda sejam submetidos ao sacramento da Reconciliação, pois é muito frutuosa a freqüentarão deste sacramento mesmo por parte daqueles que não têm pecados graves (ver Exortação “Reconciliação e Penitência” n.º 31,1). Não se deve receber a S. Eucaristia em estado de pecado grave.
2. Ultimamente tem sido proposta a distinção de quatro (e não três) tipos de pecado: o leve, o grave, o mortal e o pecado contra o Espírito Santo. 1) O pecado leve seria comparável a doenças leves que afetam um organismo. 2) O pecado grave seria uma moléstia grave,… moléstia grave que ameaça a vida, mas não acarreta a morte (assim o pecado grave não extinguiria a vida da graça santificante no cristão). 3) O pecado mortal, sim, faria perder a graça santificante; só ocorreria nos casos em que a pessoa dissesse um Não explícito a Deus, mudando sua opção fundamental ou fazendo de uma criatura o pólo de toda a sua vida. 4) O pecado contra o Espírito Santo seria o da impenitência voluntária. Segundo estas concepções, o pecado mortal seria raro, pois poucas vezes o pecador, ao procurar um prazer, tenciona revoltar-se contra Deus; por conseguinte, uma pessoa que tivesse consciência de haver pecado gravemente, poderia receber a S. Eucaristia sem recorrer ao sacramento da Penitência. Por exemplo, quem cometesse um adultério consciente e voluntário, mas logo depois se entristecesse e procurasse ser fiel ao seu matrimônio, não perderia a vida da graça e poderia assim receber a S. Comunhão.
Ora tal doutrina recente foi repetidamente rejeitada pelo magistério da Igreja. Este continua a identificar pecado grave e pecado mortal, e admite que alguém possa pecar mortal ou gravemente sem mudar a sua opção fundamental. São palavras do S. Padre João Paulo II:
“Há de evitar-se reduzir o pecado mortal a um ato de ‘opção fundamental’ contra Deus – como hoje se costuma dizer – entendendo com isso um desprezo explícito e formal de Deus e do próximo. Dá-se, efetivamente, o pecado mortal também quando o homem, sabendo e querendo, por qualquer motivo escolhe alguma coisa gravemente desordenada. Com efeito uma escolha assim já está incluindo um desprezo do preceito divino, uma rejeição do amor de Deus para com toda a criação; o homem afasta-se de Deus e perde a caridade. A orientação fundamental pode, pois, ser radicalmente modificada por atos particulares” (Exortação Apostólica “Reconciliação e Penitência” n.º 17. Ver também Declaração “Persona Humana” da S. Congregação para a Doutrina da Fé de 29/12175, n.º 10).
3. Os pecados capitais – noção
Muitos são os pecados que a fraqueza humana comete. É possível, porém, agrupá-los, por afinidade, em grandes categorias. Estas são designadas pelo elemento que lhes é comum e que toma o nome de “pecado capital” ou “pecado-cabeça”, “pecado-fonte” dos demais. Por conseguinte, pecados capitais são as principais tendências más do ser humano, das quais se originam muitos outros pecados. O adjetivo “capital”, no caso, não significa que todos esses pecados sejam graves, mas designa a amplidão e a intensidade de sua influência.
Pode-se também falar de “vícios capitais”. A palavra “vício” designa uma tendência ao pecado adquirida pela repetição dos mesmos atos maus. Assim quem freqüentemente cede à intemperança, adquire o vício de beber demais ou de fumar demais; quem muitas vezes se entrega voluntariamente ao pecado de luxúria, adquire o vício dos desmandos sensuais.
Já os pensadores pré-cristãos (como, por exemplo, o romano Horácio) apresentavam listas de pecados capitais. Entre os cristãos, listas semelhantes aparecem desde o século V. A teologia posterior as assumiu, de modo a reconhecer atualmente sete pecados capitais: soberba, avareza, luxúria, ira, gula, inveja e preguiça. Há quem enumere oito, desdobrando o primeiro em soberba e vã glória. Estudemos em particular cada uma dessas más inclinações.
3.1. Soberba
A soberba ocupa o primeiro lugar entre os pecados capitais, porque é a raiz de todos eles. Aliás, foi por soberba que o homem se afastou de Deus no início da história, cometendo o pecado original; em conseqüência, todo pecado pessoal tem sua origem na soberba (orgulho), no desejo que o homem traz em si de se preferir a Deus ou de ser o Senhor das situações.
Em que consiste o orgulho propriamente?
Todo homem possui valores naturais (inteligência, talentos, dons artísticos…) e valores sobrenaturais (a graça e os carismas concomitantes). Reconhecê-los como tais e atribuí-los à liberalidade divina, com alegria e gratidão, é moralmente reto. Todavia, desde que o homem se esqueça de que tudo é dom de Deus e queira parecer grande aos olhos dos homens por suas próprias forças, cai no pecado do orgulho e da vá glória. Geralmente quem assim procede, julga-se melhor do que os outros e tende a se endeusar.
O orgulho gera o desejo de honras e louvores, a fanfarronice, a presunção (ou a suposição de ter prendas que o sujeito não tem).
Como remédio para dissipar o orgulho, pode-se sugerir a reflexão sobre o texto bíblico de Eclo 10, 6-18 (ou 6-22), onde são recordadas a grandeza de Deus e a fragilidade do homem: “Uma longa doença zomba do médico; quem hoje é rei, amanhã morrerá. Quando um homem morre, herda insetos, feras e vermes” (Eclo 10, l0s ou 12s).
3.2. Avareza
A avareza é a procura desregrada dos bens terrestres. O avarento procura adquirir riquezas, aumentá-las sempre e retê-las avidamente. Chega a fazer destas o seu fim supremo; está a serviço do Dinheiro, e não de Deus (ver Mt 6, 24). Não há dúvida de que todo homem precisa de servir-se de bens criados; trate-os, porém, como meios para chegar ao Bem Absoluto, em vez de se deixar deter por eles. São Paulo, a propósito, diz que a avareza é idolatria (ver Ef 5, 5) e que o amor ao dinheiro é a raiz de todos os males (ver 1Tm 6, 9s).
A avareza leva muitas vezes à dureza para com o próximo, à cobiça do poder, à prática de injustiças, à falta de escrúpulos na escolha dos meios para atingir determinado fim, à insensibilidade para com os bens espirituais…
Como remédio para a avareza, pode-se propor a meditação sobre o vazio ou a insuficiência dos bens terrestres, efêmeros e ilusórios (como bem observa Eclo 14, 3-19), a grandeza dos valores eternos e o exemplo do Cristo Jesus (ver Lc 9, 57-62), que propôs algumas parábolas sobre o assunto (Lc 12,13-21; 16,19-31).
3.3. Luxúria
O prazer sexual é a expressão carnal da felicidade que existe na mútua doação de esposo e esposa. Acompanha a união conjugal para que esta se possa realizar com espontaneidade. O convívio marital do homem e da mulher assumido segundo a lei de Deus é santificado e não exclui o prazer carnal. Este é digno do ser humano, desde que animado por um amor inspirado pelo amor ao mandamento de Deus. O reto uso das funções sexuais assim entendidas constitui mesmo a virtude da castidade.
A luxúria consiste no desejo desordenado do prazer sexual; a sua desordem está em cobiçar tal prazer fora da instituição matrimonial estabelecida por Deus ou sem levar em conta as leis da natureza criada pelo Senhor, quem cede a tal volúpia, torna-se facilmente vítima de triste corrupção; a bestialidade freqüentemente sobrevêm com escândalos, perversão do próximo, crimes de roubo e morticínio, vícios de intemperança (bebidas e drogas).
Em nossos dias registra-se a tendência a legitimar certas práticas luxuriosas como o homossexualismo, a masturbação, as relações pré-matrimoniais… A propósito a Igreja publicou aos 29/12/75 a Declaração “Persona Humana” sobre alguns pontos de Ética Sexual: este documento lembra que tais práticas são antinaturais e, por conseguinte, em época alguma podem ser tidas como lícitas; não é a incidência freqüente de determinado erro que torna legítimo tal erro. Aliás, não se pode dizer que os pecados da carne não têm importância diante dos pecados de injustiça; uns e outros podem ser muito graves; nem se pode esperar a instauração de uma justa ordem social, se os indivíduos não purificam de paixões desregradas os seus corações, ou se não se convertem pessoalmente no mais íntimo de seu ser.
Como remédio para o vício da luxúria, não se pode deixar de mencionar a prática da mortificação. É esta que proporciona ao ser humano o autodomínio indispensável para que, no momento da tentação, alguém possa dizer Não aos impulsos desregrados. Embora a mentalidade moderna silencie ou até rejeite a virtude da penitência, deve-se afirmar que é impossível a alguém sair da mediocridade se não empreender dedicar-se, na medida do necessário, à prática da mortificação (cada um deve avaliar, diante de Deus, o quanto e como precisa desse exercício em sua vida).
3.4. Ira
O ser humano repele instintivamente tudo o que lhe é contrário. É legítimo reagir diante de obstáculos ao bem. Quem ama os verdadeiros valores, opõe ao mal uma energia sadia. A resignação tíbia diante do mal não é cristã. A 5. Escritura louva a atitude irada do sacerdote Finéias frente aos prevaricadores (ver Nm 25,1-17; SI 105 [106] 28-31). O próprio Senhor deu o exemplo de uma ira justa e santa quando expulsou os vendilhões do Templo (ver Mt 21,12s), quando censurou os fariseus hipócritas (ver Mt 23,13)…
A cólera torna-se pecaminosa, se ela implica desordem no exercício do poder natural de reação diante do mal: assim, por exemplo, é errôneo o fato de alguém se irritar mais contra os pecados alheios do que contra os seus (suposto que estes sejam igualmente graves); também o fato de se inflamar por motivos insignificantes ou ainda o de desejar vingança…
Os maus frutos da cólera são as brigas, os golpes físicos, os insultos, as imprecações (o “rogar pragas”)…
Como remédio para a ira, recomenda-se o exercício da circunspeção ou prudência, de modo que ninguém proceda segundo o ímpeto imediato das paixões; pense, antes, cada um no ridículo de uma atitude de cólera descontrolada. Além do que, será oportuno meditar na figura de Jesus Cristo, “manso e humilde de coração” (Mt 11, 29). Aliás, toda a história da salvação é um longo testemunho da paciência de Deus para com os homens (ver Rm 3, 25s; At 17,30; 1Pd 3,20).
3.5. Gula ou intemperança em geral
Os instintos de comer, beber e repousar-nos são dados por Deus a todos os homens; certo prazer lhes está associado para que nos desempenhemos com facilidade dessas tarefas importantes para a conservação da vida. O pecado existe quando alguém faz de tal prazer (que é mero incentivo) a finalidade de seus atos ou quando alguém valoriza os prazeres da comida e da bebida mais do que os bens espirituais.
A intemperança no comer consiste não só em comer demais, mas também em só querer alimentos requintados, com desdém dos alimentos comuns e sadios. Quem cede a tal paixão, pode chegar a fazer do ventre o seu Deus, como diz São Paulo (El 3,19). Grave é a situação de quem, por excesso de comida (ou de bebida), põe em perigo a saúde do corpo ou da alma ou se torna incapaz de cumprir as suas obrigações.
A intemperança no beber ou embriaguez pode ser pecado mais grave do que a intemperança no comer, pois o consumo de bebidas alcoólicas não é indispensável à saúde (como indispensável é o recurso à comida). A beberagem é moralmente má não só por ser um ato exagerado, mas também pela degradação que infringe ao ser humano, e pelos sérios danos que acarreta para a família da pessoa ébria; o álcool demasiado é fator de degenerescência moral e física.
O recurso ao fumo de tabaco, como tal, não é pecado, se praticado a título de recreação ou de estímulo ao trabalho. E de notar, porém, que tal uso facilmente domina a pessoa, criando-lhe dependência nociva. O abuso do fumo enfraquece a energia do sujeito, e pode afetar-lhe a saúde física; pode também gerar o egoísmo, a procura sempre mais sôfrega do prazer, o furto, etc.
Muito mais perigoso ainda é o uso das drogas, que desfiguram profundamente os valores físicos e morais dos seus clientes. Para a recuperação de tais pessoas, o meio mais eficaz é a frequentação dos grupos de Alcoólicos Anônimos (A.A.) ou Narcóticos Anônimos, grupos cujos membros, tendo superado o vício, se dedicam a ajudar os seus semelhantes ainda subjugados.
Notemos ainda o seguinte: embora não se imponha ao cristão uma total abstinência de fumo e álcool, tal abstinência pode vir a ser um ato de amor ao próximo, pois implica bom exemplo no combate contra o hedonismo (procura sistemática do prazer) amolecedor das têmperas. Além disto, quem observa que o seu apego à boa mesa, à bebida e ao fumo lhe é obstáculo para progredir na vida espiritual, está obrigado a extirpar tal apego, praticando a virtude da mortificação. A vocação à santidade que o Cristo dirige a cada cristão, é incompatível com moleza e concessões dúbias; ela exige crescente firmeza interior para a remoção das tendências desordenadas. Não se pode esquecer que o modelo do cristão é o Cristo crucificado e glorificado (ver 1Cor 2, 2; GI 6,14).
3.6. Inveja
A inveja é a tristeza que alguém experimenta por descobrir valores alheios, que lhe parecem ser obstáculos à sua glória. E compreensível que alguém, observando virtudes e bens de outrem, queira também possuí-los; pode haver uma santa emulação (competição) entre irmãos na prática do bem; essa emulação, porém, jamais deve impedir que nos alegremos cor as vitórias do nosso próximo e nos entristeçamos com as suas derrotas.
A S. Escritura apresenta a inveja (de Caim contra Abel) como primeiro pecado após a queda dos primeiros pais (Gn 4, 3-5). Ela pode levar à ira, à vingança, à difamação, à calúnia, ao ódio…; pode também gerar a alegria maldosa pela desgraça de alguém.
Para combater a inveja, recomenda-se a meditação sobre o amor e a liberalidade de Deus para com todos os homens. A prática da humildade e a da caridade para com o próximo são também antídotos salutares contra esse vício.
3.7. A preguiça
Por “preguiça” aqui não se entende a indolência para o trabalho nem o desejo desregrado de repouso e prazeres, mas, sim, a falta de gosto pelos valores espirituais, o desânimo na luta contra os defeitos morais, ou, mais brevemente, a lerdeza e o torpor na vida espiritual. A pessoa assim afetada se envolve febrilmente em afazeres terrestres; mostra-se cansada e inconstante em seus empreendimentos, deixando-se levar pelos critérios do comodismo. Pode até sentir tristeza por ter sido chamada por Deus para seguir o Cristo e entrar na vida eterna, visto que tal vocação implica desapego luta. Esse marasmo espiritual era freqüentemente denunciado pelos antigos monges, que o chamavam acédia e nele viam a porta aberta para graves pecados e desastres. Comparavam-na ao abatimento que alguém pode experimentar debaixo do sol do meio-dia, havendo já trabalhado manhã inteira e devendo ainda percorrer a outra metade do dia. A acédia pode afetar também as pessoas de ideal que chegam presumidamente metade da sua vida (aos quarenta anos); o tédio da monotonia, do cansaço e o desejo de tudo largar para recomeçar como se tivessem apenas vinte anos podem dar origem a uma crise interior (a qual, porém, é superável).
Entre as conseqüências da lerdeza espiritual, apontam-na: a não observância de obrigações tidas como incômodas (oração, Missa, mortificação…), a tagarelice, a entrega ao ócio vazio ou a atividade febril, mau humor contra aqueles que exortam à virtude, etc.
Como antídotos, são recomendadas: a prática da mortificação, que desperta a energia espiritual e tira da apatia interior; a meditação dos “novíssimos” ou da sorte final do homem; quem tem consciência nítida de que esta vida é a ante-câmara da definitiva e celeste, não se deixa ficar parado na estrada.
4. Os novos pecados capitais
Eis a lista dos novos pecados capitais, segundo os jovens, que se baseiam num relatório da Associação de Pesquisadores e Analistas da Subjetividade. – Na verdade, não é a Igreja que “cria” listas de pecado. Como dito, já os pensadores gregos e latinos pré-cristãos propuseram listas de faltas graves matrizes de outras faltas, com a diferença, porém, de que, para tais filósofos, o pecado (hamartía, em grego) era um golpe errado ou desajeitado e não uma ofensa a Deus (faltava ao pagão o conceito de um Deus pessoal, que ama o ser humano por Ele criado).
AVAREZA X CONSUMISMO
Mais forte do que o antigo pecado da avareza é hoje o seu avesso: o consumismo desenfreado e compulsivo. Para esses pecadores, o que importa não é ser; mas ter
PREGUIÇA X MANIA DE TRABALHO
A preguiça não está extinta, é claro. Mas hoje em dia mais perigosa do que o ócio pode ser a mania de trabalhar em excesso. O pecador de hoje não tem vida pessoal, desejos, emoções ou afetos. Trabalha sem parar para cumprir a ordem de lucrar ao máximo. E o workaholic.
LUXÚRIA X VOYEURISMO
O pecado da luxúria derivou para um hábito mais passivo: o voyeurismo. Sentado diante de uma TV ou participando de um chat na Internet, ele prefere fazer sexo virtual a praticá-lo na vida real.
IRA X DEBOCHE
Quem tem ódio do professor; do time rival ou do parceiro que lhe deu um fora, acaba debochando dos seus desafetos ou ridicularizando os seus inimigos. Já não há lugar para a ira.
ORGULHO X AUTOPROMOÇÃO
O orgulho está em baixa. Pouca gente se orgulha de si ou da vida que leva. Muitos acham que a autopromoção é fundamental para conquistar um bom cargo na empresa, dinheiro, status e amigos influentes.
GULA X CULTO AO CORPO
O pecado da gula foi superado por uma legião de homens e mulheres que buscam um corpo cada vez mais magro e mais jovem. A antiga gula apresenta-se hoje como anorexia, bulimia, tentativa de parecer eternamente jovem, compulsão por ginástica, uso de anabolizantes, cremes, cirurgia plástica. Tudo com o objetivo de parecer mais belo.
INVEJA X DISSIMULAÇÃO
A aparência de bom moço, adotada por algumas personalidades, algumas vezes encobre uma pessoa dissimulada. E a nova versão do invejoso. O novo pecador não deseja ser o outro ou ter o que o outro tem. Ele quer ser um personagem imaginário para agradar quem o cerca».
Os novos pecados somam-se aos anteriores, que nem por isto deixam de ocorrer no mundo de hoje.