(Revista Pergunte e Responderemos, PR 268/1983)
Em síntese: O livro em pauta to rejeitado tanto pela Comissão Doutrinal da Conferência dos Bispos dos Estados Unidos em 1977 como pela S. Congregação para a Doutrina da Fé em 13/07/1979. Os motivos de tal condenação são, entre outros, a índole subjetiva dos critérios da moralidade adotados pelos autores da obra: o bem estar que decorra de alguma prática sexual (relações pré-matrimoniais, homossexualismo, masturbação…) é suficiente para legitimar tal prática. Os autores recorrem também com freqüência a estatísticas referentes à conduta sexual dos homens de nosso tempo, atribuindo-lhes forte valor decisório em favor de práticas classicamente tidas como aberrantes. Ora sabe-se como são precárias muitas das estatísticas hoje em dia aduzidas pelos pesquisadores; além do quê, é de notar que a verdade e o bem não dependem do voto da maioria, mas pairam acima do número, grande ou pequeno, de seus adeptos.
Os critérios propriamente evangélicos, como seriam a vivência do Batismo, que é morte ao velho homem e ressurreição com Cristo para uma vida nova, estão quase apagados na perspectiva do livro em foco. A teologia da cruz e o valor desta não têm significado na definição do comportamento sexual, conforme tais autores, que insinuam a legitimidade do uso do sexo entre duas pessoas não casadas, até mesmo por divertimento.
Estas poucas observações são suficientes para justificar a condenação do livro por renomados teólogos e moralistas, como também pelos simples fiéis, que guardam a capacidade de julgar teorias a luz da fé e da Páscoa de Cristo.
* * *
Comentário: Foi publicado em 1982 um livro intitulado «A Sexualidade Humana. Novos Rumos do Pensamento Católico Americano»1 . É da autoria de Pe. Prof. Anthony Kosnik (coordenador), Pe. Prof. Ronald Modras, Sister Agnes Cunningham, Dr. William Carrol, professor de Direito, e Dr. James Schulte, especializado em Direito matrimonial. Tal estudo foi solicitado pela Sociedade Americana Católica de Teologia, que houve por bem publicar o relatório final da Comissão atrás indicada sem lhe conferir aprovação ou desaprovação (cf. p. 7). o original norte-americano foi publicado em 1977 e logo traduzido para línguas estrangeiras.
O livro provocou celeuma nos Estados Unidos da América, a ponto de induzir a Comissão Doutrinal da Conferencia Episcopal Norte-Americana a publicar Declaração condenatória do mesmo. Tal documento foi corroborado por um pronunciamento da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé datado de 13/07/1979, publicado em Apêndice a este artigo (cf. pp.208-213). Estes dois documentos, acompanhados de intervenções de Bispos diversos, evidenciam quanto é delicado e candente o conteúdo da obra em pauta. Eis por que referiremos, antes do mais, alguns dos seus traços mais salientes; a seguir, proporemos reflexões sobre o mesmo.
1. O conteúdo do obra
O livro começa por um estudo da sexualidade humana na Bíblia (cap. I) e na Tradição cristã (cap. II). Apresenta, depois, alguns dados das ciências empíricas sobre a sexualidade (cap. III) e elementos para uma teologia da sexualidade (cap. IV). Por ultimo traça diretrizes pastorais (cap. V), ao que se seguem um Pós-escrito e três Apêndices.
1. Os autores abordam todas as facetas da teoria e da prática sexual. Em alguns casos parecem apresentar apenas as sentenças de antropólogos, sociólogos ou filósofos; em outros insinuam ou explicitam diretrizes para o comportamento sexual (mesmo quando referem posições de pesquisadores das ciências humanas, os autores do livro não raro as apóiam indiretamente).
Neste contexto, o livro propõe:
1) o livre recurso a anticoncepcionais artificiais, segundo os ditames da «consciência de cada indivíduo implicado» (p.158);
2) o recurso à esterilização definitiva do homem ou da mulher, de acordo com as circunstâncias em que as pessoas interessadas se encontram (pp. 169s);
3) a inseminação artificial heteróloga (mediante doador anônimo), desde que «exista um forte desejo mútuo por parte do marido e da mulher e suficiente estabilidade na vida conjugal para compensar os riscos indicados» (p. 171);
4) a união marital sem contrato civil e sem o sacramento, também chamada «matrimônio consensual»… «Só podemos concluir que tais relações, verdadeiramente criativas e integradoras para os indivíduos implicados, podem ser também moralmente aceitáveis, pelo menos enquanto não forem supressas as restrições civis para a realização do matrimônio legal» (p.178);
5) ao julgar as relações sexuais pré-matrimoniais, dizem os autores, não se deve isolar este ou aquele ato de relacionamento sexual. Será preciso levar em conta «a relação com Deus e a posição moral dos interessados diante de todas as situações da vida». «o desprendimento, a honestidade e o desejo de levar vida verdadeiramente cristã com respeito a outras relações e dimensões podem indicar com segurança qualidades semelhantes numa conduta de um casal. No trato com católicos solteiros, é possível avaliar a seriedade e a qualidade morais de um relacionamento pelo espaço dado á oração e à participação em comum nos sacramentos da Igreja, sobretudo na Eucaristia» (p.205).
Em outros termos talvez se pudesse dizer: quanto mais «piedosos» forem os jovens, tanto mais estarão credenciados para ter relações sexuais pré-matrimoniais!
Ainda dissertando sobre a vida sexual dos solteiros, escrevem os autores: «As relações que promovem o crescimento e a integração, são moralmente boas» (p.216).
Em suma, os solteiros involuntários, os solteiros viúvos e os solteiros divorciados também estão habilitados a ter seus relacionamentos sexuais fora do matrimonio; cf. pp.217-222.
6) Sobre o homossexualismo lêem-se os seguintes pronunciamentos:
«Os homossexuais têm os mesmos direitos ao amor, intimidade e relacionamentos como os heterossexuais… As normas que regulam a moralidade da atividade homossexual são as mesmas que regulam toda atividade sexual» (p.256).
«Os homossexuais cristãos têm as mesmas necessidades e direitos aos sacramentos como os heterossexuais. Ao determinar se convém ou não dar absolvição ou a S. Comunhão a um homossexual, pode o pastor orientar-se pelo principio geral da teologia moral fundamental, de que só se pode impor uma obrigação moralmente certa. Ubi dubium, Ibi libertas. Uma dúvida invencível, seja de direito, seja de fato, permite seguir uma opinião verdadeira e solidamente provável em favor da liberdade» (p.258).
7) No tocante à masturbação, é dito à p.272:
«As pessoas que estão seriamente a braços com a tarefa de integrar a sua sexualidade, especialmente os adolescentes, deveriam ser incentivadas a receber a Eucaristia em toda oportunidade, mesmo que tenha havido incidências ocasionais de masturbação. A pressuposição é que não pecaram gravemente e por isso não perderam o seu direito de receber os sacramentos» (p.272).
8) «o travestismo implica uma preferência acentuada por usar roupas de pessoas do sexo oposto. Exprime um conflito psicossexual, que parece ser uma combinação de homossexualismo e fetichismo… Há fundadas razões para se duvidar da gravidade moral da culpa em semelhante comportamento por causa dos fatores psicológicos implicados» (p. 274).
9) Sobre a vida consagrada a Deus, lê-se:
«Homens e mulheres que estiverem se preparando para uma vida de celibato ou virgindade no testemunho cristão, hão de ser preparados para uma experiência da sexualidade humana que seja para eles criativa e integradora, dentro do contexto do seu compromisso a um estado especifico de vida» (p.283).
10) Em síntese, lê-se à p.141:
«Nenhuma expressão física da sexualidade, inclusive as práticas orais, contanto que sejam mutuamente gratificantes e aceitáveis, devem ser prejulgadas como moralmente aberrantes ou perversas» (p.141).
Este princípio, como se vê, baseando-se no caráter gratificante e aceitável da prática sexual, é apto a justificar qualquer tipo de comportamento.
2. São estas algumas das conclusões mais típicas a que chegam os autores do livro em questão. A obra, além disto, e rica em insinuações; mesmo quando os autores rejeitam alguma prática sexual, mostram-se abertos à reconsideração dependente de ulteriores pesquisas no campo das ciências empíricas humanas. Assim:
a) no tocante ao swing (balanço, oscilação) ou troca de esposas, dizem os autores:
«Estudos recentes indicam que tal atividade é superficial a longo prazo e muitas vezes redunda em alienação para as pessoas implicadas. Embora permaneçamos abertos para ulteriores resultados das pesquisas, julgamos que … swing parece destruir e alienar e, portanto, desumanizar em geral» (p. 180).
Pergunta-se: não ha outros critérios para julgar o swing senão os critérios psicológicos e os resultados das pesquisas sociológicas? Onde estão os critérios tipicamente cristãos?
b) Sobre o adultério observam os autores:
«As características de enriquecimento do outro, honestidade e fidelidade merecem atenção particular nos casos de relações sexuais escusas e comerciais. Alem disso, os orientadores deveriam levar em conta especialmente os padrões que podem se desenvolver em tais casos, atendendo ao fato de que os padrões de comportamento são mais importantes do que os atos individuais e que o sentido de um ato merece mais consideração do que o ato em si mesmo» (p.181).
Realmente e indefinida a posição dos autores frente ao adultério; os critérios, em última análise, são subjetivos: «o sentido do ato é mais importante do que o ato». E quem poderá avaliar tal sentido?
Ainda merecem atenção os seguintes dizeres:
«Estas relações (adulterinas) parecem contradizer muitas das características da sadia inter-relação sexual e, acima de tudo, comprometer a fidelidade da aliança apresentada pela S. Escritura como um ideal. Desta forma, deixando aberto o caminho para maiores pesquisas das ciências empíricas, devemos recomendar com insistência a maior cautela nestes assuntos para que não ponham em risco o crescimento e a integração tão necessários em toda atividade humana» (p.182).
Perguntamos: para julgar a moralidade de algum tipo de comportamento humano, o critério último será o das pesquisas das ciências empíricas? Não haveria princípios estruturais e decisivos para julgar a moralidade do adultério?
c) Os autores põem ainda outro problema:
«Há duas outras formas de atividade extraconjugal que podemos incluir na categoria tradicional de adultério a saber: as relações sexuais ‘co-maritais’ (triangulares) e as de ‘troca de cônjuge (‘cama redonda, quarteto ou dois casais). Os termos se aplicam aquelas situações que envolvem atividade sexual com uma ou mais pessoas alem do cônjuge, com o consentimento e muitas vezes o encorajamento de uma das partes. Muito se escreveu sobre essa dimensão da experiência sexual hoje. Alguns autores defendem esta forma de inter-relação como uma resposta verdadeiramente cristã aos problemas e carências de certos grupos na sociedade, como os anciãos e os ‘solteiros-infelizes’» (p.181).
À propósito de tal problemática observam os autores:
«Os dados empíricos até agora não nos autorizam quaisquer conclusões sólidas sobre os efeitos de semelhante comportamento, sobretudo vistos a longo prazo. A doutrina católica tradicional considera todos esses casos injustificáveis, contrários a natureza e a finalidade do matrimônio. Outros reconhecem ao menos a possibilidade teórica de tais expedientes apoiarem os princípios do verdadeiro crescimento e total integração humana» (p.182).
O que surpreende nesta passagem, é a falta de critérios objetivos ou de princípios para julgar os comportamentos mencionados. A validade moral dos mesmos defenderá apenas de «pesquisas empíricas» ou do depoimento subjetivo de pessoas devotadas a tais práticas?
Procuraremos agora avaliar as premissas e as linhas diretrizes adotadas pelos autores da obra.
Linhas diretrizes: avaliação
Proporemos seis pontos a ser ponderados.
2.1. Sexualidade e genitalidade
Os autores da obra insistem muito em que o ser humano é sexuado em toda a sua estrutura física e psíquica e em todos os seus atos (p.112). Por conseguinte «o movimento em direção ao outro, sobretudo e especificamente para alguém do outro sexo, aí está, implícito em sua existência corpora1. Por isto toma-se inconcebível, numa personalidade bem formada, a renúncia ao apetite sensível de prazer venéreo, ou, com outras palavras, é normal a procura do prazer venéreo independentemente do matrimônio; cf. pp. 129s.
Neste raciocínio 4ue se acha o cerne da argumentação dos autores em pauta. Ora tal arrazoado implica a confusão de sexualidade e genitalidade. A primeira é a masculinidade ou feminilidade que realmente caracteriza todo ser humano em cada uma de suas células sem exceção; todas as notas típicas da pessoa são sexuadas ou próprias do respectivo sexo: cabelo, voz, mãos, modo de andar… Quanto a genitalidade, é o uso dos órgãos sexuais característicos da masculinidade e da feminilidade. Ora pode-se, e deve-se, dizer que, assim como não há pessoa assexuada, não há expressão de quem quer que seja, que não se ache marcada pela masculinidade ou a feminilidade; é impossível, pois, conceber o comportamento ou um ato assexuado da parte de um ser humano. Isto, porém, não quer dizer que em toda pessoa se deva manifestar sempre a genitalidade ou o apetite erótico ou a tendência ao prazer venéreo; é possível que alguém viva plenamente a sua sexualidade sem exercer a genitalidade. Por conseguinte, as pessoas solteiras não estão obrigadas, por presumida exigência da sua personalidade, a praticar atos de genitalidade. Pode e deve haver repressão, sublimação ou transferência dos impulsos da genitalidade desde que esta não encontre as condições éticas e jurídicas adequadas (o casamento) para se exercer dignamente.
De resto, sabe-se que os impulsos sexuais são muitas vezes comandados (direta ou indiretamente) pelo psiquismo do sujeito (fantasia ou imaginação, conceitos e preconceitos…) em conseqüência, se alguém julga que, para se realizar plenamente, não pode deixar de exercer a sua genitalidade, sentirá impulsos sexuais veementes, que o sujeito dificilmente conseguira dominar. se, porém, a mesma pessoa se convencer de que pode ser personalidade masculina ou feminina plenamente realizada sem o exercício da genitalidade, experimentará menos impulsos eróticos e conseguirá viver dignamente a sua castidade.
Muito a propósito lê-se na Declaração da S. Congregação para a Doutrina da Fé sobre o livro em pauta:
“Não é no âmbito da sexualidade genérica que se vem inserir o problema moral da castidade. Insere-se sobretudo no campo mais especifico do ser e do comportamento sexual que é chamado sexualidade genital. Esta, embora compreendida no âmbito genérico da sexualidade, tem as suas regras próprias, correspondentes a uma estrutura e a uma finalidade própria e não coincidem, sem mais, com as da sexualidade genérica. Por conseguinte, quando em ‘A Sexualidade Humana’ se cita o primeiro parágrafo de ‘Persona Humana’, como já foi notado, esquece-se o que segue na doutrina deste documento sobre a sexualidade humana, de modo especial o nº. 5, que afirma claramente: ‘O uso da função sexual tem o seu verdadeiro sentido e a sua retidão moral só no matrimônio legítimo” (ver Apêndice a este artigo, p. 210 deste fascículo).
2.2. Critérios para julgar a moralidade da vida sexual
A doutrina clássica ensina quanto segue:
A vida sexual é uma função da pessoa humana que está associada a órgãos próprios, dotados de suas finalidades e de suas leis naturais. o prazer venéreo que decorre do uso dos órgãos sexuais, não é uma finalidade ou uma espécie de passatempo agradável que se justifique por si mesmo ou a titulo de recreação para o homem . Esse prazer é um anexo…, anexo a ordem natural das coisas, que tem em mira a prole ou a fecundidade; esse prazer só pode existir legitimamente ou só pode ser desfrutado se o indivíduo exercita uma função que tem sua finalidade própria ou a fecundidade. Isolar o prazer a fim de o desfrutar significa inverter a ordem da natureza por motivos hedonistas; significa violar a natureza o que não se faz sem detrimento, físico ou moral, para quem a viola.
Por conseguinte, o uso da genitalidade ou a fruição do pravenéreo é regido pelas leis da natureza (que exigem a estabilidade do matrimônio), e não pode ser provocado somente em vista do próprio prazer.
À p.81 lê-se:
“Pode ser o sexo mero divertimento ou ensejo de gratificação sensual? Parece haver consenso do que o sexo pode ser usado como divertimento num contexto de respeito mútuo e atenção”
Ora os autores do livro rejeitam tal critério objetivo para avaliar o uso da genitalidade e propõem outros, que são de índole acentuadamente subjetiva, a saber:
1) «o bem-estar da pessoa total»; cf. pp. 146-147, 154, 157, 168. «A avaliação moral da contracepção e da esterilização há de ser vista a luz do bem-estar geral da pessoa» (p.154).
Pergunta-se agora: E como definir «o bem-estar geral da pessoa»? Trata-se de bem-estar físico, sensível? Não há também um bem-estar derivado do cultivo de valores espirituais, que exige, não raro, a renuncia a valores físicos e sensíveis? Os cristãos julgam que o bem-estar decorre, antes do mais, dos valores espirituais do indivíduo, especialmente da consagração, a Deus, do ser e da atividade de alguém, mesmo com exclusão dos prazeres venéreos.
2) A p.87 aparece como critério o «levar existência deveras humana».
Mais uma vez pergunta-se: que significa, no caso, o «deveras humana»? Implica satisfação sensível como supremo critério? Quem respondesse afirmativamente, reduziria o homem ao modelo pansexualista de Freud, que e unilateral e deformador da personalidade humana, pois na verdade Os valores deveras humanos» incluem o predomínio do espírito sobre a matéria.
3) O critério para avaliar os atos sexuais seria «a função criativa e integradora» dos mesmos, conforme pp. 94, 131, 180s, 185, 210…
De novo, a expressão e genérica e plurivalente, deixando margem a interpretações diversas e ao subjetivismo.
4) Os dados das ciências empíricas (sociologia, psicologia, etnologia…) são também, conforme os autores, critérios para se perceber a evolução do comportamento sexual da humanidade e formar juízos de valor que possam estar em antagonismo com os clássicos julgamentos morais; cf. pp.82-100.
As novas experiências sexuais serão tidas como válidas ou não válidas, do ponto de vista moral, em função das conseqüências que tenham sobre a saúde e o bem-estar daqueles que as praticam. Todavia, reconhecem os autores, as pesquisas empíricas até hoje pouco elucidaram o sentido de certas práticas sexuais. Apenas se pode dizer que «a pesquisa revela que qualquer forma de comportamento sexual humano imaginável é sancionada por esta ou por aquela cultura. Não existe comportamento universalmente proibido. Ao mesmo tempo, não existe uma cultura que não tenha algum tabu sexual» (p.78).
5) A pesquisa do comportamento de irracionais também é levada em consideração.
«Outra via de abordagem é observar o comportamento sexual de animais. A concepção de base é que animais infra-humanos… destituídos de 1iberdade… podem mostrar certos absolutos naturais. O que se descobriu, foi que existem animais, em várias espécies, que se entregam. a comportamento sexual nem sempre diretamente visando a reprodução, mas apenas o prazer. Entregam-se à auto-estimulação, homossexualidade e a cópula fora da espécie» (p.78).
Tais critérios de moralidade ou de validade dos atos humanos supõem simplesmente que a verdade ou o bem estejam sempre do lado mais numeroso entre os homens ou do lado dos animais irracionais. o modelo a seguir seria ou o comportamento da maioria dos homens ou o dos animais irracionais. – Ora é notório que a verdade e o bem são independentes do número de seus adeptos; pode haver desmandos coletivos, gregários, alucinados… que, nem pelo fato de serem coletivos, são decisivos para o homem que reflete.
Ainda a respeito de estatísticas e amostragens, faz-se mister observar que ela são, muitas vezes, de valor dúbio, parcial ou quiçá tendencioso. É preciso usar de grande cautela para apoiar sobre elas alguma conclusão.
6) Os autores ainda enumeram sete predicados que devem ornar a sexualidade humana e a tomam legítima: a) auto-libertadora; b) enriquecedora do outro; c) honesta; d) fiel; e) socialmente responsável; f) promotora da vida; g) alegre.
Como se vê, tais notas devem ornar não somente o comportamento sexual, mas, de modo geral, a conduta do ser humano como tal; são insuficientes para especificar o relacionamento sexual propriamente dito, que deve ter suas características peculiares, como todo ato humano tem as suas. A propósito observe-se o que diz a Declaração da S. Congregação para a Doutrina da Fé:
“Os autores do livro tentam … Imprimir um conteúdo mais concreto ao critério formal, ‘crescimento criativo para a integração’, mas quase nada deste desenvolvimento parece referir-se a atividade sexual genital. É verdade que eles têm apenas em vista apresentar alguns ‘valores significativos’, todavia os citados (por exemplo, ‘sincera’, ‘alegre’, ‘socialmente responsável’) poderiam otimamente dar-se como postulado a maior parte das atividades do homem”.
Os autores pretendem que estes não sejam critérios puramente subjetivos, embora na realidade a sejam: os juízos pessoais acerca destes fatores são tão diferentes – determinados por sentimentos pessoais, emoções; costumes, etc. que seria quase impossível descobrir critérios claros de tudo a que pode exatamente contribuir para a integração de cada pessoa e para a seu crescimento em quaisquer atividade sexual especifica” (ver Apêndice, p.212).
Em síntese, lamentamos que os critérios assinalados pelos autores não dêem a necessária ênfase à objetividade das normas morais (Os autores não a recusam por completo; cf. p.155), mas se detenham demasiadamente no subjetivo e contingente, ou seja, nos aspectos do bem estar, integração, criatividade…, que deixam margem aos mais contraditórios e esdrúxulos tipos do comportamento.
2.3. Lei natural e liberdade
Os autores rejeitam o conceito de lei natural biológica como norma para o comportamento humano e propõem em seu lugar o uso da liberdade criativa.
A esta tese propomos as seguintes observações:
1) A rejeição da lei natural acarreta consequentemente uma atitude fortemente subjetiva e quiçá arbitraria na aferição dos valores morais. Tudo pode tornar-se válido neste contexto sob a alegação de que concorre para o «bem-estar total» do sujeito.
2) A liberdade criativa não é um fim, mas um meio através do qual o ser humano se deve tomar mais e mais o que ele já é embrionariamente por sua própria natureza. A propósito pode-se aduzir a segu4nte imagem: um abridor de latas foi planejado pelo seu fabricante para a finalidade específica de cortar metal resistente; uma lâmina de barba, ao contrário, é concebida pelo seu planejador em vista da finalidade especifica de se aplicar à barba. Se, porém, alguém, em nome da sua liberdade criativa, quiser desrespeitar a natureza (e a «lei natural») de cada um destes dois instrumentos, aplicando a lamina ao metal resistente de uma lata e o abridor de lata á pele do rosto, não se beneficiará, mas, ao contrário, testemunhará a sua incompreensão e imaturidade; desfigurar-se-á sem conseguir resultado algum. Assim a pessoa que quiser usar a sua liberdade de maneira criativa, para fazer no piano sexual o que lhe pareça desejável, sem levar em conta a natureza e a estrutura própria das suas funções orgânicas genitais, não se tornará mais feliz, nem se realizará melhor, mas, ao contrário, prejudicar-se-á grandemente. A liberdade criativa, por conseguinte, foi dada ao homem para que possa, de maneira consciente e espontânea, atender as leis ou exigências da sua natureza o que é penhor de grandeza e felicidade; a violação da natureza geralmente é nociva a quem a comete.
2.4. O velho homem e a Cruz
O livro em foco sugere, de ponta-a-ponta, o atendimento aos apetites da carne:
“A sexualidade humana flui livre e espontaneamente da profundeza do ser da pessoa. Gera auto-segurança, promovendo com isso o pleno desenvolvimento das capacidades da pessoa para a crescimento e a auto-expressão. Há um legítimo auto-interesse e auto-realização que a expressão sexual se destina a servir e satisfazer” (pp. 121s) 1
“A importância do elemento erótico, isto é, o desejo instintual de prazer e gratificação merece ser afirmada e encorajada. A expressão sexual humana existe para ser gozada sem sentimentos de culpa ou remorso. Deveria refletir a apaixonada celebração da vida, que ela desperta” (p. 12).
Estes dizeres supõem um conceito de natureza humana «rousseauniano», ou seja, otimista sem reservas. Não levam em consideração o fato de que a natureza humana, ontologicamente boa, se acha desordenada até desregrada no plano dos seus apetites. Há instintos meramente emotivos, irracionais e cegos, no homem, que contradizem as aspirações mais elevadas da razão e da fé, como notava o Apóstolo (fazendo eco, aliás, a pensadores anteriores):
1 Neste texto, “sexualidade” significa propriamente “genitalidade”. O que se afirma a respeito de sexualidade, não só poderia afirmar tão irrestritamente no tocante a genitalidade.
“Sou carnal, vendido como escravo ao pecado… Não pratico o que quero, mas faço o que detesto… Eu sei que o bem não mora em mim, isto é, na minha carne. Pois o querer o bem está ao meu alcance, não, porém, o praticá-lo. Com efeito, não tão o bem que eu quero, mas cometo o mal que não quero…
Quando quero fazer o bem, o mal que se me apresenta. Eu me comprazo na lei de Deus segundo o homem interior, mas percebo outra lei em meus membros, que peleja contra a fé. da minha razão e que me acorrenta a lei do pecado que existe em meus membros! Infeliz de mim” (Rm 7,14-24).
A existência da concupiscência desregrada dentro do ser humano levou, em todos os tempos, Os mestres de espiritualidade crista a recomendar a ascese ou a disciplina e a mortificação dos instintos ou das paixões desordenadas. Quem dá vazão a todos os seus impulsos carnais, tendo em vista o prazer ou o bem-estar, jamais se tomará livre, mas será sempre escravo ou joguete dos instintos. Freud, aliás, concebia o homem como impelido por instintos e devedor a estes, a tal ponto de não poder entender a mortificação ou renuncia; esta seria fator de neurose, quando na verdade vem a ser passagem para a verdadeira liberdade e plena realização da personalidade.
2.5. Não pulverizar o comportamento humano
Os autores muito insistem em que não se deve considerar isoladamente cada ato humano, mas coloca-lo sempre no contexto da vida do indivíduo.
É verdade que os autores, a p. 132, mencionam “uma dose saudável do ascetismo e autodisciplina” que “deve necessariamente acompanhar a esforço de ser sensível e responder sexualmente”.
Todavia esta referência a ascese quase não tem repercussão no conjunto do livro, que antes incita o leitor a dar largas ao apetite do prazer sexual, qualquer que seja a seu estado de vida (solteiro voluntário ou involuntário, casado, viúvo, homossexual, narcisista, tendendo ao travestismo, vocacionado para a celibato. ..).
Cremos que os autores tiveram uma intuição autêntica ao mencionar a ascese no contexto citado, mas não souberam ser coerentes com essa intuição, que desaparece no conjunto da tese.
Este princípio e válido. Todavia não deveria levar a crer que não há atos isolados destoantes da linha geral de comportamento de alguém. Com efeito, pode haver atos plenamente conscientes e voluntários que estejam em contradição com a habitual conduta de vida de um cristão. O ser humano é fraco e, por isto, sujeito a incoerências. Verdade é que, quando um desvio ocorre a titulo esporádico e momentâneo, pode ter menos gravidade do que quando resulta de atitudes premeditadamente más.
2.6. Uso dos documentos oficiais da Igreja
Quem lê a obra em pauta, pode conceber a impressão de que faz eco genuíno aos recentes documentos da Igreja relativos à sexualidade: Constituição Gaudium et Spes do Concílio Vaticano II, encíclica Humanae Vitae de Paulo VI, Declaração Persona Humana da S. Congregação para a Doutrina da Fé.
Verifica-se, porém, que tais documentos são utilizados de maneira parcial apenas e filtrados por premissas que não condizem com as de tal documentação.
a) Tenha-se em vista, por exemplo, a citação da Declaração Persona Humana ocorrente a p.131, onde se lê:
“A virtude da castidade não se limita a evitar as faltas indicadas; ela tem ainda exigências positives e mais elevadas. É uma virtude que marca toda a personalidade no seu comportamento, tanto interior como exterior” (no 11 de Persona Humanae).
Interpretando tal afirmação, os autores pouco adiante afirmam:
“A castidade torna possível o desenvolvimento intrapessoal e interpessoal, convidando a uma resposta ativa às possibilidades que a sexualidade humana oferece. A repressão, supressão ou negação dessas possibilidades só um desvio da. virtude assim como também o a capa insensata do prazer sensual como objetivo ultimo da vida” (p. 131).
Ora nesta frase «sexualidade» parece confundir-se com «genitalidade, como sói acontecer no decorrer do livro. Consequentemente a castidade seria a virtude que levaria a usar da genitalidade de maneira criativa e integradora. Em resposta, afirmamos que isto é verdade entre cônjuges, notando-se, porém, que «maneira criativa e integradora não significa isenção de normas objetivas ditadas pela lei natural. Todavia, ao se tratar de pessoas solteiras, a castidade será a virtude que levara a expansão da sua masculinidade e feminilidade de acordo com as normas da retidão e honestidade sem chegar a genitalidade.
b) À p.107, o livro cita a Constituição Gaudium et Spes, do Concílio do Vaticano II:
“Os estudos e as descobertas mais recentes das ciências, da história e da filosofia despertam problemas novos, que acarretam conseqüências também para a vida e exigem dos teólogos novas investigações” (no. 62).
De acordo com as observações assim formuladas, os autores se voltam freqüentemente para os dados das ciências empíricas e para os efeitos do comportamento sexual sobre a saúde física, mental e a vida da sociedade contemporânea; cf. pp. 180, 181, 184…
Ora julgamos ser muito importante levar em conta todos estes dados, pois a Teologia não pode ignorar a realidade humana nem os sinais dos tempos. Contudo sabemos que há comportamentos de multidões que podem ser aberrantes; a teologia moral não é simplesmente a canonização da conduta da maioria dos homens; o cristão é algo como sal na terra e fermento na massa (cf. Mt 5,13; 13,33) – o que quer dizer que o cristão pode e deve oportunamente ter um sabor de vida diferente, que seja sinal de uma filosofia diversa ou da intuição de um mistério transcendental. Se o cristão não. for tal, para nada servirá senão para ser lançado fora e pisoteado pelos homens. Daí a necessidade de coragem para não trair os princípios do Evangelho frente a tipos de comportamento não evangélicos, sem, porém, mostrar agressividade ou hostilidade aos que não compartilham a moral evangélica.
São estas algumas ponderações que nos ocorrem após a leitura atenta do livro em foco.
Permita Deus seja lido por um publico madura e sadiamente critico!
Observamos, de resto, que nos Estados Unidos mesmos apareceu uma refutação da obra em pauta aos cuidados de William E. May e John F. Harvey, com o titulo On understanding “Human Sexuality”. Franciscan Herald Press, Chicago 1977.
APÊNDICE
Vai, a seguir, transcrita a referida Dec1aração da S. Congregação para a Doutrina da Fé, acompanhada de carta introdutória dirigida ao Sr. Bispo Presidente da Conferencia Episcopal Norte-americana.
A Sua Excia. Rev.ma o Senhor Dom John R. Quinn, Presidente da Conferência Episcopal Americana
CARTA DA SAGRADA CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ
Excelência Reverendíssima
Ao livro «Human Sexuality: New Directions in American CathoIic Thought» (A sexualidade humana: novas diretrizes no pensamento católico americano) – estudo mandado fazer pela Catholic Theological Society of America e entregue aos cuidados do Rev. P. Anthony Kosnik foi dada grande publicidade, sendo difundido não só nos Estados Unidos mas também noutros países, quer no língua inglesa, quer nas várias traduções.
A Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé deseja louvar a ao dos Bispos Americanos, que souberam exercer o seu ministério pastoral como autênticos mestres da fé, chamando a atenção dos seus sacerdotes e dos fiéis para os erros contidos no mencionado livro, particularmente no que diz respeito á inaceitabilidade das (diretrizes pastorais) como normas válidas para a formação da consciência cristã em matéria de moral sexual.
A Congregação deseja louvar especialmente a Comissão Doutrinal da Conferência Episcopal pela sua declaração de novembro de 1977, que dó uma apreciação do livro capaz de poder servir aos Bispos e a toda a Comunidade Católica, não só nos Estados Unidos mas onde quer que o livro se espalhou. As «Observações desta Congregação, aqui anexas, poderão também ser úteis aos Bispos na direção prudente e continua do povo sabre esta delicada questão pastoral.
Ao mesmo tempo não pode esta Congregação deixar de exprimir que está preocupada par uma insigne associação de teólogos católicos ter organizado a publicação deste relatório, de tal modo que difunde largamente os princípios e as conclusões errôneas deste livro, criando assim uma fonte de confusão entre o povo de Deus.
Ficaria grato a Vossa Excelência Reverendíssima se propusesse esta carta a atenção dos membros da Conferência Episcopal.
Com os mais cordiais respeitos, apresento-lhe os melhores votos pessoais.
Em Cristo
FRANJO Card. SEPER
Prefeito
Roma, 13 de julho de 1979
DECLARAÇÃO
da Sagrada Congregação para a Doutrina: da Fé
sobre o livro «A Sexualidade Humana»
estudo confiado
pela «Catholic Theological Society ‘of America»
ao cuidado do Rev. P. Anthony Kosnik
O livro «A Sexualidade humana» já foi criticado na substância por teólogos, por numerosos Bispos americanos e pela Comissão Doutrinal da Conferência Episcopal Americana. Vê-se claramente que, a luz de tais criticas, os autores do livro que falam de animar outros a continuar conosco a busca de respostas mais adequadas e satisfatória ao mistério da sexualidade humana (p. XVIII) devemos reconsiderar rigorosamente as posições tomadas. Esta reconsideração é mais que nunca necessária porque o assunto do livro («A Sexualidade humana») e a tentativo de oferecer «algumas diretrizes úteis a pastores de almas, a sacerdotes, a diretores espirituais e a professores muitas vexes perplexos e incertos» impõe aos autores enorme responsabilidade quanta as conclusões errôneas e ao influxo potencialmente danoso que estas idéias podem ter no correto formação da consciência cristã de muitas pessoas
Considerando que o livro e as suas opiniões tiveram grande difusão nos Estados Unidos, noutros países de língua inglesa, e noutros ainda devido às várias traduções, esta Sagrada Congregação julga dever seu intervir, chamando a atenção para os erros contidos no livro e convidando os autores a corrigi-los. Reduzimos as nossas considerações a alguns erros que parecem ser os mais fundamentais e entram no núcleo do problema, embora esta limitação não deva levar a concluir-se que não haja neste livro outros erros de natureza histórica, bíblica e teológica.
1) Erro muito freqüente no livro é a manipulação do conceito ou definição de sexualidade humana. «o sexo é portanto a modalidade particular com que os seres humanos notam e exprimem tanto o serem incompletos na sua individualidade quanta o estarem relacionados uns com os outros como machos e fêmeas… Esta definição alarga o significado da sexualidade além da estreita e única concepção genital ou procriativa, e esta é a perspectiva em que a sexualidade ó inserida nas reflexões que vão seguir-se» (p. 64). Esta reflexão refere-se aquilo que em modo genérico se pode chamar sexualidade; neste sentido, a sexualidade é vista como força que abraça, influencia e condiciona qualquer ato da pessoa, em qualquer momento da vida» (p.63). Sempre neste sentido genérica, cite o livro a «Declaração acerca dalgumas questões de ótica sexual», documento que reconhece esta basilar diferenciação humana, afirmando: «Ao sexo, no verdade, vai a pessoa humana buscar as características que, no plano biológico, psicológico e espiritual, a fazem homem ou mulher, condicionando assim em grande medida a caminho do seu desenvolvimento até á maturidade, e a sua inserção na sociedade» (Persona Humano, 1).
Todavia, não é no âmbito desta sexualidade genérica que se vem inserir o problema moral da castidade. Insere-se sobretudo no campo mais especifico do ser e do comportamento sexual que ó chamado sexualidade genital. Esta, embora compreendida no âmbito genérico da sexualidade, tem as suas regras próprias, correspondentes a uma estrutura e a uma finalidade própria e não coincidem, sem mais, com as da sexualidade genérica. Por conseguinte, quando em «A Sexualidade humana» se cita o primeiro parágrafo de «Persona Humana», como já foi notado, esquece-se a que segue na doutrina deste documento sobre a sexualidade humana, de modo especial a nº 5 que afirma claramente: «O uso da função sexual sem o seu verdadeiro sentido e o sua retidão moral só no matrimônio legítimo».
É na mesma medida evidente que a Vaticano II, no nº 51 do Gaudium et Spes, foi claramente do sexualidade genital e não do sexualidade genérico ao afirmar: a caráter moral do comportamento sexual «não depende apenas do sincero intenção e da apreciado dos motivos, mas é determinado por critérios objetivos, que se fundam na natureza mesma do pessoa humana e dos seus atos, a se destinam a manter, num contexto de amor verdadeiro, a sentido completo do doação mútuo e da procriação humana; e tudo isto não será possível se não for cultivado com sinceridade a virtude da castidade conjugal». Enquanto a primeira parte desta citação é usada muitas vezes em «A sexualidade humana», a ultimo é ordinariamente omitida, omissão que se aplica também a frase seguinte da Gaudium et Spes que diz: Os filhos da Igreja, fundados nestes princípios, ao regularem a procriado, não poderão seguir caminhos que estão condenados pelo magistério do Igreja, quando este interpreto a lei divina». De fato, falando este livro exclusivamente de sexualidade genital, põe de porte as normas específicos que dizem respeito a esta e tento resolver a questão com Os critérios da sexualidade genérica (cf., mais abaixo, a n 2).
Além disso, no que diz respeito a doutrino do Vaticano II, fazemos notar outro conceito errado. o livro diz a rediz recusar o Concílio deliberadamente manter a hierarquia tradicional de fins primários a secundários do matrimônio, abrindo a Igreja a uma compreensão nova e mais profunda do significado e dos valores do amor conjugal (p. 76ss). Pelo contrário, respondendo a proposta, apresentado por muitos Padres, de inserir-se no texto, n 48, esta distinção hierárquica, a Comissão encarregada dos Modos declara explicitamente: Num texto de caráter pastoral, que pretende estabelecer diálogo com o mundo, não se requerem elementos jurídicos… Seja como for, a importância primordial da procriação e da educação aparece pelo menos dez vezes no texto» (cfr. nn. 48 e 50).
2) Segundo o modo de considerar a sexualidade, tal como ele é descrito em «A sexualidade humana», a formulação dos seus fins sofre mudança radical, se comparada com a formulação clássica. O fim tradicional da sexualidade, «procriativo e unitivo», explicando coerentemente em todos as documentas do magistério, compreendidas o Vaticano II a «Humanae Vitae», é substituído por um fim «criativo e integrativo», chamado também «crescimento criativo para a integração», que descreve uma finalidade ampla e vaga, aplicável a qualquer sexualidade gene rica e praticamente a todos as ações humanas. Admitida embora que a procriação é uma só, de todas as formas possíveis, do criatividade, mas não essencial à sexualidade (cfr. p. ó5ss), isto representa sempre mudança gratuita de termos agora aceitos, mudança que não é fundada em argumentos substanciais e contradiz a formulação usada pelo Vaticano II e retomada em «Persona Humano». Esta mudança dos finalidades, e por conseguinte dos critérios do moralidade, no sexualidade humana, modifica evidentemente todas as conclusões tradicionais sobre o comportamento sexual e, mudando a terminologia comum, fecha até a porta á .possibilidade dum debate fecundo teológico.
3) Os autores do livro tentam, além disso, imprimir um conteúdo mais concreto ao critério formal, «crescimento criativo para a integração» (p 7lss), mas quase nada deste desenvolvimento parece referir-se á atividade sexual genital. E verdade que eles tem apenas em vista apresentar alguns «valores significativos» (p.71), todavia os citados (por exemplo «sincero», «alegre», «socialmente responsável») poderiam otimamente dar-se como postulado á maior parte das atividades do homem.
Os autores pretendem que estes não sejam critérios puramente subjetivos, embora na realidade o sejam: os juízos pessoais acerca destes fatores são tão diferentes – determinados por sentimentos pessoais, emoções, costumes, etc. – que seria quase impossível descobrir critérios claros de tudo o que pode exatamente contribuir para a integração de cada pessoa a para a seu crescimento em qualquer atividade sexual especifica.
Assim, no cap. 5 os critérios para discernir qual é o crescimento criativo para a integração, quando são aplicados a áreas específicas da atividade sexual, não levam a regras práticas ou úteis para uma séria formação da consciência em questões sexuais. Mais, no livro são chamados «linhas diretrizes» coisas que não podem nunca ser consideradas normas morais absolutas e universais (p 75).
4) As aplicações práticas propostas no cap. 5 mostram claramente as conseqüências destas teorias sobre a sexualidade humana. Tais conclusões se apartam do ensinamento católico, assim como coerentemente proposto pelos teólogos morais e ensinado pelo magistério da Igreja, ou a contradizem diretamente. Por desgraça, ficou tristemente por acabar, e até mesmo invertida, a intenção expressa no prefácio: «O cap. 5…….. quer oferecer aos pastores ocupados no ministério algumas informações e diretrizes que as ajudem a formar a dirigir a consciência dos fiéis nesta matéria, segundo um projeto de vida que se inspira em Jesus Cristo».
Os autores quase sempre encontram escapatória para permitir o «crescimento para a integração», descurando ou destruindo qualquer elemento intrínseco da moral sexual, especialmente a seu fim procriativo. Se depois chegam a desaprovar algumas formas de comportamento sexual, é só por causa da suposta ausência, expressa geralmente sob forma de dúvida, duma «integração humana» (como no caso de «swinging» – relações sexuais promíscuas, troca das esposas, bestialidade) e não porque tais ações se oponham à natureza mesma da sexualidade humana. Quando chegam a considerar algumas ações completamente imorais, não é nunca por motivos intrínsecos, baseados numa finalidade objetiva, mas só por autores não verem nenhum recurso para as levar a que sirvam a integração humana. Dependerem assim, argumentos teológicos e científicos, de critérios apreciados na sua essência sobre a base da experiência imediata acerca do que é humano ou menos humano, dá azo a um relativismo de comportamento humano que deixa de reconhecer qualquer valor que seja absoluto.
Com estes pressupostos, não admira que o livro preste tão pouca atenção aos documentos do Magistério da Igreja e muitas vezes contradiga abertamente a seu claro ensinamento e as suas úteis normas morais, no campo da sexualidade humana.
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«PERMITIR-ME-ÃO AFIRMAR ISTO, APOS TER VIVIDO O CONCÍLIO E TER-ME ALEGRADO COM SEUS FEITOS: CERTOS FENÔMENOS DA IGREJA ATUAL EXIGEM QUE EU CHAME A ATENÇÃO DE TODOS PARA O FATO DE QUE, COM O TEMPO, A VIDA CARISMÁTICA PODE DESTRUIR A SI MESMA, A MENOS QUE OS DIREITOS DIVINOS DO MAGISTÉRIO SEJAM SINCERAMENTE RECONHECIDOS E LEALMENTE RESPEITADOS» (CARDEAL HENRI DE LUBAC).