Controle da natalidade: o não aos anticoncepcionais admite exceção?

(Revista Pergunte e Responderemos, PR 450/1999)

Em síntese: Há quem alegue que, quando o casal não pode seguir os métodos naturais de contenção da natalidade, é lícito o recurso aos anticoncepcionais. – A propósito observe-se que os anticoncepcionais truncam a natureza e, por isto, violam a lei natural, que é a lei de Deus. Por isto em caso nenhum se tornam lícitos. Dos métodos naturais o mais seguro é o de Billings (98,5 %), que, em vez de sacrificar um só dos cônjuges, une o casal, exigindo a colaboração das duas partes para que mantenham o propósito de continência nos dias fecundos do organismo feminino.

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Via internet, a Redação de PR recebeu a seguinte mensagem, à qual responderá nas páginas subseqüentes:

“Em conversa com amigos católicos pela internet, deparei-me com a afirmação abaixo:

‘Se houver algum problema que impeça o casal de usar os méto­dos naturais, a Igreja permite o recurso aos métodos artificiais. Para isso, converse com um padre de sua confiança’.

Isto quer dizer que, quando a mulher tem ciclo menstrual por de­mais irregular ou existam outros problemas que não permitam ao casal fazer um planejamento familiar responsável mediante os métodos natu­rais, a Igreja permite o uso dos anticoncepcionais? Caso afirmativo, quem na Igreja tem autoridade para dar a permissão? Qualquer padre? So­mente um Bispo? Ou os padres designados para estudar os casos?”.

RESPONDENDO…

Eis o que se deve dizer a respeito:

Comecemos pela pergunta: por que é que os meios artificiais para conter a natalidade não são lícitos e chegam a ter contra-indicações médicas?

A iliceidade não se deve a um decreto da Igreja, mas sim à própria lei natural, que é a lei do Criador. Na verdade, existe uma lei natural anterior à lei dos homens (eclesiásticos ou civis). Observe-se o organis­mo humano: está sujeito a certas normas para poder viver sadiamente: assim à lei da alimentação, e da alimentação bem ponderada (não é lícito comer qualquer coisa atraente);… à lei da respiração (não é possí­vel respirar gás carbônico sem incorrer em graves conseqüências);… à lei do repouso (não há como trabalhar sem descansar adequadamen­te);… e também às leis da genitalidade: o aparelho genital humano é unitivo (promove a união do marido e da mulher) e é fecundo em certos dias do mês; a natureza torna a mulher fecunda. Em conseqüência, os anticoncepcionais ferem a natureza – o que contraria à lei do Criador. Eis por que a Igreja, fiel ao Senhor Deus, rejeita os anticoncepcionais; estes descaracterizam a sexualidade, proporcionando o gozo de um prazer com detrimento do funcionamento normal da natureza.

É claro, porém, que, quando a natureza é, por si mesma, estéril não há pecado em procurar a cópula sexual. Isto se faz sem recursos artificiais ou sem anticoncepcionais.

De resto, a própria medicina e o bom senso reconhecem que a pílula anticoncepcional é nociva ao organismo. Na verdade, é um prepa­rado farmacêutico colocado num organismo que funciona bem, para que não funcione bem. Isto só pode fazer mal.

Por conseguinte, vê-se que a Igreja (Bispo ou padre) não pode autorizar o uso de anticoncepcionais em caso algum. Não é facultado à Igreja dizer que é permitido aquilo que a lei de Deus não permite. Se o fizesse, estaria traindo o Senhor Jesus.

A dificuldade que muitos experimentam para aceitar tal posição, está no preconceito de que o uso da genitalidade é um imperativo inexorável, ao qual não se pode escapar sem incorrer em doença. Ora este preconceito freudiano é falso. A genitalidade é uma das expressões da pessoa humana, mas não é a única nem a mais exigente; ela tem que ser inserida no quadro geral da personalidade, que tende a um ideal. Pode alguém professar o celibato ou a vida una e indivisa e sentir-se altamente realizado sem exercer a genitalidade. Faz-se necessário, por­tanto, vencer o preconceito de que o sexo é imperioso e deve ser pratica­do em qualquer hipótese.

Alguém perguntará: mas a continência periódica, sem algum anti­concepcional, não é algo de arriscado? Fala-se de “filhos da tabelinha”. – Na verdade, a tabela de Ogino-Knaus está superada; atualmente reco­menda-se o método de Billings ou do muco cervical, que tem a garantia de 98,5 % de êxito.

Vale a pena transcrever aqui uma página do Dr. João Evangelista dos Santos Alves, que expõe os aspectos positivos dos métodos naturais:

«O método natural não é anticoncepcional porque não utiliza ne­nhum tipo de contraceptivo, pois respeita as fontes da vida e o processo biológico da reprodução humana, opta pela realização do ato sexual so­mente no período infértil, com abstenção no período fértil;

– Respeita a mulher e o homem em sua mútua fertilidade,

integri­dade e dignidade;

– Promove o diálogo conjugal, favorecendo o conhecimento mútuo dos cônjuges e uma atitude conjunta e responsável diante da sexualidade;

– Possibilita um controle generoso do número de filhos pelo conhe­cimento dos períodos férteis e inférteis; a identificação do período fértil favorece a concepção, quando for esse o desejo do casal;

– Valoriza o amor conjugal, reforçando a união de almas e o enten­dimento mútuo, a fim de possibilitar a periódica abstenção sexual;

– Enobrece a sexualidade humana, assumindo-a, ambos, como fonte de amor mútuo e não de egoísmo, e respeitando sua natureza e finalidade intrínsecas…

A Medicina, como qualquer outra ciência, tem que ser orientada pela Filosofia, que a subordina a valores éticos. Não está a Medicina obrigada a realizar tudo o que a tecnologia possibilita fazer; pelo contrá­rio, existem limites éticos que resguardam valores fundamentais, univer­sais e perenes.

E aqui está a grande diferença entre a Ciência Médica e as outras ciências naturais: a dignidade de sua matéria de trabalho, que na Medici­na é o próprio ser humano e nas outras ciências naturais são os seres irracionais e os seres inanimados.

O ser humano constitui a finalidade de todas as ciências, mas para a Ciência Médica, além de ser o fim, o ser humano constitui também o meio, a sua matéria de trabalho.

Assim, ao contrário dos médicos, os demais cientistas, trabalhando para o bem da humanidade, podem e devem – resguardada a preserva­ção da natureza – fazer quase tudo que a tecnologia moderna possibilita que façam, pois o material que manipulam é destituído de tão grande dignidade, encontrando-se a serviço do homem: os átomos, as molécu­las, os minerais, vegetais, animais, etc.

Já os médicos, eticamente, não podem e não devem fazer tudo o que a tecnologia possibilita que façam, pois sua matéria de trabalho é o seu semelhante, é o próprio ser humano a quem devem servir e respeitar.

O abandono desta filosofia implica em regressão e desvalorização da própria ciência e em desrespeito à dignidade da natureza humana.

Não é possível promover a vida humana desvalorizando-se a própria natureza da vida que se quer promover” (Direitos Humanos, Sexuali­dade e Integridade na Transmissão da Vida, em A Vida dos Direitos Humanos, coletânea organizada por Jaques de Camargo Penteado e Ricardo Henry Marques Dip. Porto Alegre 1999, pp. 248-250).