Eutanásia: eutanásia e testamentos de vida

(Revista Pergunte e Responderemos, PR 416/1997)

Em síntese: A eutanásia, legalizada na Austrália do Norte, vai sendo aplicada. A Moral Católica é contrária à eutanásia direta ou positiva, que consiste em matar o paciente com um ato explicitamente mortífero; todavia não se opõe à suspensão de tratamentos sofisticados quando estes não produzem efeitos proporcionados aos recursos empregados.

Quanto aos “testamentos de vida”, são lícitos dentro de certos parâmetros: a toda pessoa humana em pleno uso de suas faculdades mentais é permitido definir como deseja e não deseja ser tratada em caso de doença grave, desde que não peça o “suicídio assistido”; ao médico e aos familiares não compete executar a eutanásia direta, ainda que solicitada pelo enfermo. O uso de analgésicos é moralmente aceito, mesmo que possam abreviar a duração da vida do paciente, desde que sejam aplicados com a intenção exclusiva de aliviar as dores da pessoa doente; todavia é para desejar que não suprimam por completo a lucidez da mente do enfermo, pois este tem interesse em terminar sua vida de maneira consciente, tendo-se reconciliado com Deus e os irmãos, se necessário.

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Um fato ocorrido na Austrália chamou, mais uma vez, a atenção do mundo para a eutanásia, que vai tomando formas sempre mais esmeradas. Vamos, a seguir, recordar o fato e abordar as questões que ele suscita.

1. O Caso Australiano

Eis o que se lê no jornal O GLOBO de 27/09/96, p. 32:

“Primeira eutanásia voluntária na Austrália
Carpinteiro doente de câncer aciona computador para receber injeção letal.

TERRITÓRIO DO NORTE, Austrália. Um carpinteiro australiano de 66 anos que sofria de câncer na próstata transformou-se domingo passado na primeira pessoa em todo o mundo a morrer recorrendo à eutanásia voluntária autorizada por lei. Robert Dent foi o primeiro beneficiário da Lei sobre Direitos dos Doentes Terminais – aprovada em julho passado no Território do Norte – que permite que o doente ponha fim à própria vida apertando a tecla “sim” de um sistema controlado por computador, para receber uma injeção letal na veia.

A aplicação da lei provocou a indignação da Igreja Católica. O Vaticano afirmou que nenhum sofrimento humano pode justificar a prática do suicí­dio assistido.

0 pedido de Dent foi aceito pelo Governo do Território do Norte e ele morreu domingo à tarde em sua casa no povoado de Darwin ao lado de seu médico, Phillip Nitschke, e da mulher, Judy.

Antigo defensor da eutanásia e responsável pelo desenvolvimento do sistema que permite ao paciente se matar, Phillip Nitschke disse que Dent morreu minutos depois de autorizar que a chamada “máquina da morte” administrasse em sua veia a injeção letal, uma mistura potente de relaxante muscular e anestésicos.

– Tomou sua última refeição e conversou com a mulher antes de aci­onar o computador. Depois de apertar a tecla, dormiu e pouco depois mor­reu. – contou o médico. – Foi duro, mas acho que tomei uma medida huma­nitária.

A lei australiana exige que o candidato à eutanásia seja examinado por três médicos residentes no Território do Norte, entre eles um especia­lista no mal de que padece e um psiquiatra. Confirmadas a doença fatal, a impossibilidade de evitar sofrimentos e a vontade consciente de morrer, o próprio doente tem a opção de apertara tecla do computador para receber a injeção letal. A legislação é inédita porque o próprio paciente administra a solução na veia. Na Holanda, a prática da eutanásia é tolerada, apesar de proibida oficialmente.”

Vejamos agora o que diz a Moral Católica a respeito

2. Eutanásia e Consciência Católica.

A eutanásia é a morte suave ou a morte provocada em alguém que está gravemente enfermo sem esperança de recuperação.

Distinguimos as seguintes modalidades de eutanásia:

Eutanásia direta ou

Eutanásia indireta por suspensão de recursos ordinários e

Eutanásia indireta por suspensão de recursos extraordinários ou desproporcionais

A eutanásia direta é o ato de infligir a morte ao paciente aplicando-lhe um recurso mortífero (injeções ou coisa semelhante). Diga-se logo: este procedimento é sempre ilícito, porque o homem não tem o direito de dispor nem da sua vida nem da vida do irmão inocente. Nenhuma situação dolorosa justifica a eutanásia direta. Aliás, por trás da compaixão para com o enfermo pode haver motivos egoístas e interesseiros que levem os acompanhantes a provocar a morte do paciente: cansaço, despesas avul­tadas, perspectivas de herança, etc.

A eutanásia indireta consiste em subtrair a um paciente os recursos sem os quais lhe é impossível conservar a vida. Tais recursos podem ser ordinários ou extraordinários.

Os recursos ordinários são os de rotina, que costumam ser aplica­dos a qualquer enfermo: soro, alimentação leve, injeções convencionais, transfusão de sangue… Não é lícito suspendê-los, desde que estejam dentro do alcance das posses do paciente ou dos seus familiares. Sonegá-los ao doente seria provocar-lhe a morte.

Os recursos extraordinários (ou, melhor, desproporcionais) são os que exigem aparato humano, material ou financeiro altamente difícil ou penoso sem que se possa prever um resultado médico compensador; as probabilidades de recuperação ou de melhora do paciente são quase nu­las ou são desproporcionais à carga de recursos raros e difíceis que se lhe aplicam. Tal era o caso de Karen Quinlan, o do generalíssimo Franco, o do Marechal Tito. Ora a Moral Católica, apoiada em Declaração da Santa Sé (05/05/80), ensina que não há obrigação, em consciência, de aplicar tais recursos.

Como se entende, a proporção ou a desproporção existente entre determinado tratamento e as probabilidades de êxito pode ser diversa­mente apreciada; esta avaliação envolve sempre um tanto da subjetividade de quem a realiza. Será necessário, porém, que com toda a lealdade, diante de Deus, as pessoas responsáveis (a começar pelos médicos) pro­curem considerar a situação e tomar a decisão mais fiel possível aos dita­mes da Moral.

0 uso de analgésicos (atenuantes da dor) é lícito ao cristão, pois o sofrimento pode atordoar o enfermo. Importa, porém, que os analgésicos não impeçam o doente de dispor de suas faculdades mentais. Com efeito; o ser humano deve poder enfrentar a consumação de sua vida terrestre de maneira lúcida e consciente; tal é o momento decisivo para pedir perdão e perdoar, reparar alguma injúria cometida, formular as últimas recomenda­ções e, principalmente, receber os sacramentos dos enfermos. É, pois, para desejar que, mesmo usando analgésicos, o paciente tenha seus momentos de lucidez para tomar tais providências.

A propósito, levem-se em consideração as ponderações do Papa Pio XII em alocução a uma assembléia de clínicos, cirurgiões e anestesistas em 24/02/1957:

“Toda forma de eutanásia direta, isto é, a administração de narcóticos com o fim de provocar ou apressar a morte, é ilícita, porque nesse caso se pretende dispor diretamente da vida. Um dos princípios fundamentais da Moral natural e cristã é que o homem não é senhor nem dono, mas somente usufrutuário, do seu corpo e da sua existência. Ora o homem arroga-se o direito de disposição direta da vida toda vez que a quer encurtar. Na hipótese por vós encarada (hipótese lícita), trata-se unicamente de evitar ao paciente dores insuportáveis, por exemplo, em caso de câncer não sus­cetível de operação ou em caso de doença incurável…

0 moribundo não pode permitir, e menos ainda pedir, ao médico que lhe provoque o estado de inconsciência, se com isso se coloca em situa­ção de não poder satisfazer a deveres morais graves, por exemplo, ao dever de regrar negócios importantes, de fazer o seu testamento e de se confessar.. Para julgar a liceidade da narcose, é preciso também inquirir se este estado será relativamente breve (com ou sem interrupção); será preciso considerar outrossim se o uso das faculdades voltará em certos momentos, por alguns minutos ao menos ou por algumas horas, dando ao moribundo a possibilidade de fazer o que o seu dever lhe impõe (por exem­plo, reconciliar-se com Deus). Por outra parte, um médico consciencioso, embora não seja cristão, não cederá jamais às instâncias de quem dese­jasse, contra a vontade do moribundo, fazer-lhe perder a lucidez, para o impedir de tomar certas decisões.

Quando, não obstante as obrigações que lhe incumbem, o moribundo pede a narcose e, para a usar, existem motivos sérios, um médico consci­encioso não se prestará a isso sobretudo se for cristão, sem ter convidado o doente por si mesmo ou, melhor ainda, por intermédio de outrem, a cum­prir antes os seus deveres. Se o doente obstinado se negar a tal cumpri­mento e persistir no pedido de narcose, o médico poderá conceder-lho sem se tornar culpado de colaboração formal na falta cometida…

Se o paciente cumpriu todos os seus deveres e recebeu os últimos sacramentos, se indicações médicas claras sugerem a anestesia, se não se ultrapassa na fixação das doses a quantidade permitida, se se mediu cuidadosamente a intensidade e a duração do estado de inconsciência, e ainda se o interessado consente em tal tratamento – então nada se opõe: a anestesia é moralmente permitida”.

Aos familiares e amigos do enfermo toca um papel especial nesta fase da história em que a medicina tende muitas vezes a isolar os doentes em Unidades de Terapia Intensiva. O paciente, sujeito à aparelhagem te­rapêutica moderna, sente falta de carinho humano; a presença de um ente querido em tais circunstâncias lhe é de imenso valor. Por isto se fala hoje de “humanizar a morte” – o que significa “considerar as carências huma­nas e afetivas dos enfermos”, completando a função da técnica impessoal.

É para desejar que os familiares e amigos não permitam (na medida do possível) que um enfermo católico venha a morrer sem conhecer a gravidade de sua moléstia; é preciso que o momento da morte seja aceito com magnanimidade pelos que têm fé. É triste verificar que não raro todos os acompanhantes de um enfermo sabem que está para morrer, ao passo que o próprio enfermo (o mais interessado de todos!) o ignora ou mesmo julga ter recuperação. Não há dúvida, porém: para que um cristão tenha condições de enfrentar serenamente a sua morte (ou consumação), deve aproveitar os dias de boa saúde (quando a morte parece mais distante), a fim de se preparar para ela. Meditar sobre a morte é prática de piedade que toda a Tradição cristã muito recomenda.

3. Os “Testamentos de Vida”

“Testamento de Vida” (Living Will) é uma expressão recente. Signifi­ca o documento redigido por alguém, em pleno uso de suas faculdades mentais e de sua liberdade, segundo o qual a pessoa define a maneira como quer ser tratada em caso de doença grave ou de moléstia terminal. O testador tanto pode aceitar que lhe apliquem todos os recursos da mo­derna medicina para lutar contra a morte como pode solicitar que não lhe apliquem meios sofisticados que só fazem prolongar o sofrimento e a ago­nia do enfermo. Nos últimos anos tem-se admitido nessas disposições do testador também a vontade que de o submetam à eutanásia direta, como foi o caso de Robert Dent na Austrália do Norte.

Os “testamentos de vida” são, hoje em dia, assaz freqüentes, visto que a medicina possui recursos sempre mais variegados para protelar a morte de alguém. Acontece, porém, que tais recursos não raro privam o paciente do contato com seus familiares e entes queridos, obrigando-o à internação em Centro de Terapia Intensiva sem esperança plausível de recuperação. Diante desses procedimentos há quem proclame a autono­mia do enfermo e seu direito de aceitar ou não tal ou tal tipo de tratamento; nem o médico nem os familiares são plenipotenciários em relação ao pa­ciente. – Pergunta-se:

3.1. Que diz a Moral Católica a respeito?

A Moral Católica reconhece a autonomia do paciente, desde que não implique o pretenso direito ao “suicídio assistido” ou à eutanásia direta; ninguém é senhor de sua vida própria nem da vida alheia. Portanto é lícito a um enfermo renunciar a uma terapia complexa que não logre resultados proporcionais aos meios aplicados. Quem deve avaliar essa proporciona­lidade, é o médico ou a junta médica respectiva.

O bem do paciente não consiste apenas em alívio dos sofrimentos causados pela moléstia; este deve certamente merecer atenção. Mas deve­-se também levar em consideração o fato de que o enfermo é criatura que há de prestar contas ao Criador do uso que tenha feito de sua vida na terra; na verdade, a vida terrestre é apenas um segmento da existência de alguém, segmento que se prolonga no além ou, melhor, que é a prepara­ção imediata para a plenitude da vida no além. Tal concepção contribui para relativizar as fases dolorosas da vida terrestre; estas não definem, por completo, a existência de alguém; são, por assim dizer, etapas prepa­ratórias para a vida plena na Casa do Pai. Daí se segue a necessidade de que a criatura deixe este mundo entregando-se a Deus na aceitação do plano do Pai, que só permite o sofrimento porque tem a finalidade provi­dencial de configurar o paciente a Cristo: “Se com Ele sofremos, com Ele reinaremos. Se com Ele morremos, com Ele viveremos” (2Tm 2,11s).

Ao médico não é lícito atender ao pedido de “suicídio assistido”, pois o médico jurou salvar a vida física e não a destruir. Quanto aos familiares, também não lhes toca executar tal pedido, pois eles sabem que não são senhores da vida alheia. A propósito observa o S. Padre João Paulo II na sua encíclica “O Evangelho da Vida” n° 67:

“Bem diverso é o caminho do amor e da verdadeira compaixão, que nos é imposto pela nossa comum humanidade e que a fé em Cristo Reden­tor morto e ressuscitado ilumina com novas razões. A súplica que brota do coração do homem no confronto supremo com o sofrimento e a morte, especialmente quando é tentado a fechar-se no desespero e como que a aniquilar-se nele, é sobretudo uma petição de companhia, solidariedade e apoio na prova. É um pedido de ajuda para continuar a esperar quando faltam todas as esperanças humanas. Como nos recordou o Concílio do Vaticano II, ‘diante da morte o enigma da condição humana atinge o seu ponto alto… Mas é por uma inspiração acertada do seu coração que ele afasta com horror e repele a ruína total e a morte definitiva de sua pessoa. A semente de eternidade que o homem traz dentro de si, irredutível à pura matéria, insurge-se contra a morte’ (Gaudium et Spes n° 18)”.

É interessante registrar aqui algumas modalidades dos “testamentos de vida” ou (segundo outro termo) “Indicações Antecipadas”, a partir dos primeiros que foram elaborados.

3.2. Traços de História

Distinguem-se “testamentos” que recusam a eutanásia e outros que a pedem.

3.2.1. Excluída a Eutanásia

Em 1974 a Associação dos Hospitais Católicos dos Estados Unidos propôs definições intituladas Christian Affirmation of Life. Exigiam que o paciente “fosse, se possível, consultado a respeito das práticas médicas destinadas a prolongar a vida diante das ameaças de morte próxima”, poderia também o enfermo pedir que “não se utilizassem meios extraordi­nários para prolongar a vida”.

Em 1989 a Conferência dos Bispos da Espanha publicou um docu­mento sobre Eutanásia e Assistência ao Moribundo, que compreendia duas partes. A primeira formulava princípios gerais – a noção de vida como dom e bênção de Deus, o conceito de morte como acesso à vida sem fim na presença ou na visão de Deus face-à-face. A segunda parte propunha diretrizes práticas: a liceidade de recusar meios desproporcionais em situ­ações críticas irrecuperáveis, a legitimidade de rejeitar o prolongamento abusivo e irracional da agonia, a conveniência da presença de familiares, a necessidade de assistência religiosa ao paciente, a validade de analgé­sicos, mas… a recusa da eutanásia direta.

Em 1989 também a Caritas Suíça elaborou um documento sobre “Disposições de Fim de Vida”, dirigidas ao médico que trata de pacientes gravemente enfermos. Manifestava a necessidade de que cada paciente se prepare conscientemente para a morte; rejeitava a eutanásia, lembran­do que “não é o homem, mas é Deus, quem define a hora da morte”.

Seja citado ainda o Protective Medical Decision Document, Docu­mento de Proteção das Decisões Médicas, proposto pela International Anti-Eutanasia Task Force, segundo o qual cada paciente designa a pes­soa que deverá ser ouvida para tomar decisões relativas à própria saúde, nas situações críticas em que ele próprio não estiver em condições de tomar pessoalmente uma decisão.

Em tal documento, porém, é expressamente proibida qualquer forma de eutanásia; solicita-se a atuação de todas as intervenções que ofereçam razoáveis esperanças de proveito para a saúde do doente; diante da mor­te iminente, pede-se que se usem todos os meios ordinários de assistên­cia apropriados às condições do paciente, incluindo os analgésicos e a alimentação. É claro o esforço de querer tirar das mãos de familiares mais ou menos interessados, dos tribunais ou de médicos sem escrúpulos, de­cisões importantes que dizem respeito à fase terminal da própria doença.

3.2.2. Incluída a Eutanásia

A primeira tentativa de incluir a eutanásia num “testamento de vida” foi rejeitada. Com efeito, em março de 1969 foi apresentado na Câmara dos Lordes do Reino Unido um projeto de lei sobre a eutanásia voluntária (Voluntary Euthanasia Bill) em que se reconhecia a legitimidade de decla­rações assinadas pelo paciente – de maioridade e legalmente capaz – na presença de duas testemunhas, nas quais o paciente pedia, entre outras coisas, que, em presença de particulares condições clínicas, pudesse ser submetido à eutanásia, em tempos e circunstâncias por ele determinados, ou, em caso de incapacidade, segundo a discrição do médico sob cujo tratamento se encontrasse. O projeto de lei foi recusado por 61 votos con­tra 40, sobretudo pelo uso ambíguo que nele se fazia de alguns termos, como “doença irreversível, doente terminal, suspensão do tratamento de sustentação vital.”

0 primeiro documento que adquiriu força de lei – no qual se usa pela primeira vez o termo living will – foi promulgado em 1976 pelo Estado da Califórnia (U.S.A.) e é conhecido como Natural Death Act, uma lei em que se reconhece a qualquer adulto o direito de dispor antecipadamente sobre a recusa de “terapias de sustentação vital” quando se vier a encontrar “no extremo da condição existencial”, e isto tanto no sentido de suspendê-las se já iniciadas, como de não recorrer a elas.

Sucessivamente leis análogas se estenderam a outros Estados da União norte-americana; desde 1991 entrou em vigor uma lei federal sobre a autodeterminação do paciente (Patient Self Determination Act). Com tal lei reconhece-se o direito de cada paciente a tomar decisões sobre as terapias médicas que lhe dizem respeito, incluindo o direito de recusar ou aceitar tratamentos médicos ou cirúrgicos e de formular declarações ante­cipadas de vontade, que o médico deve considerar.

Iniciativas análogas no sentido de favorecer por lei a elaboração de disposições por parte dos pacientes encontram-se e vão-se difundindo também noutros países. Na Itália, concretamente, foi divulgada pela Co­missão de Bioética a “Carta de Autodeterminação”. Tal documento – que já no próprio título implica uma concepção problemática do homem, o qual pretende dispor totalmente da própria vida e da própria morte – contém o risco duma verdadeira e própria expressão de eutanásia ativa ou de que­rer antecipar o evento natural da morte.

As notícias destas páginas relativas aos “testamentos de vida” de­vem-se ao artigo de Antonio G. Spanolo, Professor do Instituto de Bioética da Faculdade de Medicina da Universidade Católica do Sagrado Coração em Roma, artigo publicado em L’OSSERVATORE ROMANO, ed. portu­guesa de 7/9/1996, pp. 8s.

São estes dados que ilustram o caso da “primeira eutanásia voluntá­ria na Austrália”, de que tratou a imprensa em setembro 1996.

O cristão compreende a angústia de quem está sofrendo e não pode deixar de se solidarizar com o paciente. Mas ele sabe que o desejo de vida no ser humano é tão arraigado que a perspectiva da morte sempre causa instintivo horror e repulsa a quem quer que seja. Por conseguinte, a res­posta do médico e dos familiares a quem peça a eutanásia, há de ser propiciar alívio das dores e assistência carinhosa (que é o que o paciente mais deseja); essa assistência carinhosa terá em vista mostrar ao enfer­mo que ele não está só e, se for religioso, há de procurar prepará-lo para o encontro definitivo com o Senhor Deus; somente a perspectiva da fé contribui para valorizar o próprio sofrimento (participação da Páscoa de Cristo) e para encarar o transe final como consumação da carreira terres­tre e entrada na plenitude da vida.

 

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