(Revista Pergunte e Responderemos, PR 368/1993)
O celibato sacerdotal é objeto de acalorados debates nos meios de comunicação social e nas escolas. A insistência em discutir o assunto provém do fato de que só pode ser bem entendido a partir dos valores da fé, valores que ultrapassam a compreensão meramente natural do homem. – A fim de elucidar a questão, vai, a seguir, publicado um belo estudo do Pe. Geraldo Luiz Borges Hackmann, da arquidiocese de Porto Alegre (RS); abrange a questão de modo amplo, percorrendo a história e a motivação teológica do celibato. O leitor certamente sentir-se-á feliz por ler as valiosas considerações do autor, ao qual a Redação de PR exprime a sua profunda gratidão.
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O Celibato Presbiteral: História e Motivações
1. Introdução
O celibato dos presbíteros está em pauta novamente. Diversas publicações recentes sobre o assunto expõem argumentos favoráveis ou contrários.
O clima que envolve hoje o debate em torno do celibato presbiteral, é o da reivindicação: o desejo é o da abolição da lei canônica que atualmente une presbiterato e celibato. O motivo da opinião pela escolha livre do celibato é a falta de vinculação teológica entre o carisma presbiteral e o do celibato. Também fazem parte deste panorama a reivindicação da ordenação de homens casados e a readmissão ao exercício do ministério daqueles presbíteros que o deixaram e se casaram.
Este artigo tem um objetivo bem preciso. Deseja refletir sobre a história da lei canônica do celibato presbiteral e os motivos que levaram a torná-lo obrigatório na Igreja Latina.
2. A história do celibato na Igreja Latina
A apresentação histórica do celibato é muito variada, seguindo o ponto de vista dos autores.[1] No entanto, é possível buscar coordenadas sobre as origens históricas da lei canônica do celibato.
a) Os três primeiros séculos
É inegável a existência de ministros casados e não casados desde as origens do cristianismo. 0 Novo Testamento traz diversos textos que comprovam este costume. Ainda não há nenhuma lei canônica, particular ou geral, que proíba a ordenação de homens casados ou que exija a separação entre o presbítero casado e sua esposa ou a observância da continência no matrimônio.
A única legislação existente neste período parece ser a proibição de presbíteros viúvos contraírem novo casamento e viúvos receberem a imposição das mãos para o ministério presbiteral. O motivo apoia-se em 1Tm 3,2 e Tt 1,6: o bispo deve ser homem de uma só mulher (“vir unius uxoris”). Nesse período ainda não havia distinção entre o presbítero e o episcopo.[2]
No entanto, ao lado dos ministros casados, conforme atestam no século III Clemente de Alexandria, Orígenes e Cipriano[3], paulatinamente cresce o desejo e a motivação para o celibato, sem imposição de nenhuma lei canônica. Assim, a Igreja dos dois primeiros séculos descobre o valor da virgindade cristã e tem grande apreço por aquelas pessoas às quais Deus concedeu esse dom. Diversos Santos Padres da Igreja assim testemunham. Tertuliano (aproximadamente 155-220) na obra De exhortatione castitatis recomenda a castidade a um seu amigo que havia perdido a esposa.[4] S. Cipriano[5] V, Clemente de Alexandria (este na obra Stromateis ou Stromata) recomendam vivamente o celibato em vista de uma maior liberdade de espírito, baseado no exemplo de São Paulo[6].
Orígenes aponta as seguintes razões para o celibato: paternidade espiritual dos presbíteros para os cristãos; a disponibilidade apostólica; um sacrifício como hóstia viva e santa oferecida a Deus na própria carne; a virgindade é uma preparação para o estado paradisíaco do corpo glorificado, que se deixa assumir totalmente pelo Espírito; as impurezas das relações conjugais[7].
O século III apresenta uma mudança na prática em relação aos ministros. As igrejas do Egito, África e Síria introduzem o costume de preferir ordenar os celibatários. Tertuliano e Orígenes são defensores deste costume,[8] por verem maior perfeição no celibato, além de aconselhar os presbíteros casados a viverem como irmãos com sua esposa. Os motivos elencados são os seguintes: com a continência, o presbítero restabelece a carne em sua dignidade originária; a continência permite pertencer ao Senhor sem divisão e torna o presbítero mais disponível para sua tarefa pastoral.[9] Assim, começa a surgir a idéia de uma certa incompatibilidade entre sacerdócio e matrimônio.[10]
b) Os séculos IV e V
Estes dois séculos apresentam uma mudança radical no costume até aqui existente. Os concílios vão adotando uma legislação clara sobre o celibato sacerdotal. Essa legislação proíbe ao presbítero ordenado celibatário contrair matrimônio posteriormente e ao presbítero casado continuar a ter relações conjugais com a sua esposa.
O concílio espanhol de Elvira (por volta de 305) é o primeiro concílio da Igreja no qual se encontram cânones disciplinares sobre o celibato. Os 81 cânones tratam de questões muito diversas. O cânon 33 proíbe aos bispos, presbíteros e diáconos, ocupados com o altar, terem relações sexuais com a esposa. Portanto, é uma lei de continência para os ministros casados antes da admissão às ordens. Há referência a uma tradição anterior, embora a lei seja nova.[11]
O primeiro concílio de Arles, em 314, adota igual prescrição do concílio anterior, quando, no cânon 29, proíbe as relações sexuais por causa do serviço quotidiano do ministério sacerdotal. A não observância implica na perda da “honra de clérigo”. Como na prescrição do concílio de Elvira, aqui há uma lei de pureza ritual: a continência em vista do serviço ao altar.[12]
O concílio de Ancira, também de 314, reunindo bispos da Ásia Menor e da Síria, propõe, no cânon 10, uma verdadeira lei de celibato sacerdotal, diferenciando-se, por isso, dos dois concílios anteriores. 0 cânon 10 prescreve a proibição do casamento para o diácono ordenado célibe.[13]
O concílio de Neo-Cesaréia (entre 314 e 325) estabelece a mesma proibição para o presbítero. 0 cânon 1 prescreve a exclusão da ordem clerical para um presbítero que se casa.[14]
Assim, esses dois últimos cânones estabelecem uma verdadeira lei de celibato, ao lado da lei de pureza ritual, como a formularam os dois primeiros concílios. É possível concordar, em certo sentido, com Schillebeeckx, quando ele afirma que a lei da continência ou da pureza ritual está presente na origem da lei do celibato, mas é necessário discordar dele quando ele diz ser essa a única causa.[15]
O concílio de Nicéia (325), primeiro ecumênico, defende, no cânon 3, a possibilidade do bispo, presbítero e diácono ter uma ‘irmã” consigo, de acordo com os primeiros séculos da Igreja.[16]
As razões para tal legislação mostram que a idéia, nascida no século III, da ligação do sacerdócio com o celibato foi sendo aceita cada vez mais. Os argumentos também foram-se impondo e sendo aceitos, tendo em vista a idéia de que a continência faz crescer no presbítero a presença do Espírito Santo (João Crisóstomo); a continência torna o presbítero mais disponível para o seu ofício apostólico (Eusébio de Cesaréia, Epifânio de Salamina e João Crisóstomo) e propicia a fecundidade espiritual da castidade sacerdotal (Eusébio de Cesaréia).
c) Do século VI ao final do século X
A legislação, no ocidente, permanece imutável. A Igreja continua a ordenar homens casados, embora com a obrigação da continência, apesar de poder manter a esposa consigo. 0 Concílio de Clermont, de 535, ensina que o sacerdócio deverá renunciar à comunidade conjugal após a ordenação e transformar a relação conjugal em amor fraterno. A Igreja urge a observância de tal legislação por meio de diversos meios e sanções[17], sinal de que muitas vezes não foi observada.
A proibição, aos ministros célibes, de contrair matrimônio apresenta diversidade. Antes de Carlos Magno parece ter sido habitualmente observada. 0 problema surge quando Carlos Magno abre escolas para clérigos jovens e é introduzido o costume de ordenar os presbíteros cada vez mais jovens e educados em vista do sacerdócio desde a infância. A partir daí, há casos de casamentos após a ordenação, que eram considerados gravemente ilícitos, mas não inválidos.
Apesar das transgressões à lei do celibato, motivadas pelas condições sociais nas quais o clero se vê forçado a viver por causa dos benefícios, da situação de muitas igrejas locais e das investiduras, que fazem chegar ao ministério presbiteral pessoas desprovidas de atitudes e de qualidades morais e religiosas adequadas ao ministério assumido[18] e, a lei se mantém como norma para a autêntica disciplina sacerdotal. As sanções não depõem contra o celibato, mas são sinal do comprovado reconhecimento da unidade entre o sacerdócio e o celibato. Os livros penitenciais consideram a não observância do celibato dos clérigos como um “adulterium”, pois o celibato foi prometido a Deus.[19]
A Reforma Gregoriana no século XI procura atacar o mal pela raiz e, assim, urge a observância do celibato para concretizar a finalidade da restauração da disciplina do clero. Para atacar a simonia, o nicolaísmo e as investiduras, por parte dos leigos, apela para a Tradição e para os Santos Padres, com a finalidade de restaurar a disciplina antiga e autêntica da Igreja. Apesar de tudo, a “vita canonialis”, incentivada por Gregório Magno, não teve o sucesso almejado.[20]
Assim, a situação do clero no final do século X pode ser dividida em três grupos: o primeiro, padres ordenados já casados, que podiam coabitar com a esposa, mas obrigados à continência; o segundo, ministros ordenados jovens que permanecem fiéis e poucos praticando a “vita canonialis”; o terceiro, o grupo dos ordenados jovens que contraem matrimônio após a ordenação, apesar de ser considerado inválido.
d) Os séculos XI e XII
Dois concílios tornaram universal e obrigatória a lei do celibato: o primeiro concílio de Latrão (1123) e, explicitamente, o segundo concílio de Latrão (1139), nos cânones 6 e 7. Esse último concílio, ao declarar nulo o matrimônio contraído após a ordenação, conclui uma história iniciada no século IV e que se estende até o século XII. No entanto, o que importa é ver as motivações para a decretação dessa lei que proíbe a ordenação de padres casados ou que exige a identidade entre o carisma do ministério presbiteral e o carisma do celibato. A partir daí, o matrimônio passa a ser um impedimento para a ordenação sacerdotal.
e) Do século XIII em diante
Após esses dois concílios, não há novidade na legislação canônica sobre o celibato.
O papa Inocêncio III, empenhado incansavelmente pela reforma do clero, reconfirma as decisões dos concílios anteriores no IV,concílio de Latrão (1215) e decreta a deposição dos clérigos que não observam a lei do celibato e continuam a celebrar a Missa, apesar de previamente censurados (cf. DS 817). Os papas Alexandre III, Clemente III, Honório III, Gregório IX e Bonifácio VIII continuam no mesmo caminho. Igualmente os concílios de Constança (1414-1418) e de Basiléia (1431-1437).
O concílio de Trento, nas sessões XXIV (11 de novembro de 1563) e XXV (3 de dezembro), confirma a disciplina vigente (cf. DS 1809), procurando coibir a nova observância do celibato e a oposição proveniente da Reforma.[21]
A partir da metade do século XVII, não há sérios problemas na observância do celibato, como era desejado pelos reformadores desde a época gregoriana. A formação recebida nos seminários e a valorização da espiritualidade contribuíram para chegar a esse resultado.[22]
Recentemente, o concílio ecumênico Vaticano II confirma a legislação sobre o celibato sacerdotal: “O Sacrossanto Sínodo torna a reconhecer e a confirmar esta legislação para os que se destinam ao Presbiterato, confiando no Espírito que o dom do celibato, tão coerente com o sacerdócio do Novo Testamento, seja outorgado com liberalidade pelo Pai (… )” (Presbyterorum Ordinis 16).
f) Conclusão
Esta breve exposição histórica pode ser concluída com algumas observações, decorrentes da mesma:
1. A lei do celibato foi nascendo espontaneamente, a partir da consciência do valor do celibato como dom de Deus e conseqüente afinidade entre esse e o sacerdócio;
2. Apesar de toda a pressão contra a lei do celibato e a falta de observância do mesmo em vários períodos de sua história, contudo, a Igreja nunca colocou em questão o fundamento e a aplicação da lei, aceitando-os;
3. Quanto mais brilha a fidelidade da Igreja a Cristo, tanto mais o celibato é aceito e vivenciado. A reforma da vida da Igreja sempre caminhou junto com a reforma do clero, chamado a ser sinal de seguimento de Jesus Cristo.
3. As motivações da lei canônica do celibato
As opiniões acerca dos motivos que conduziram à formulação do carisma do celibato como uma lei obrigatória para a Igreja latina são muito diversas. Há os que defendem a motivação econômica como a predominante, pois o celibato dos presbíteros evitaria a dispersão dos bens eclesiásticos por não haver herança a ser repartida entre filhos, mantendo, deste modo, a concentração dos bens nas mãos da Igreja e contribuindo para aumentar seu poder.[23] Outros opinam que na origem está a lei de continência ou de pureza ritual, tendo por base a visão negativa da sexualidade e do matrimônio.[24]
Outros defendem a opinião de que a lei do celibato eclesiástico está ligada à sacralização progressiva do serviço pastoral. A razão fundamental desta posição é o aumento do número de presbíteros que, sem se importarem com a lei de pureza ritual, preferem manter-se celibatários por motivos espirituais e para poderem, assim, melhor desempenhar o serviço sacerdotal, que progressivamente adquire um caráter sacral pelo afastamento do presbítero da esfera secular. Há inúmeros testemunhos dos Santos Padres que confirmam esta opinião.[25]
Isto levou a constatar a presença de uma profunda motivação espiritual para o celibato desde o início, que vai predominando até chegar a estabelecer-se como uma lei canônica. Esta posição parece estar mais de acordo com o núcleo central da ligação entre sacerdócio e celibato e mostra mais claramente a harmonia entre ambos, pois destaca a novidade da inspiração cristã sempre presente, apesar da variação das razões explícitas (Sacerdotalis caelibatus 18). É o que será exposto a seguir.
a) O fundamento evangélico do celibato (dimensão cristológica e escatológica):
Refletir como cristão sobre o celibato implica, necessariamente, buscar as razões do mesmo nas palavras e no exemplo de Jesus Cristo, origem inspiradora do seguimento cristão, e reconhecê-lo como um dom do Espírito à Igreja.
A fascinação exercida por Jesus Cristo em alguns levaram-nos a abandonar tudo e assumir o estilo de sua vida, inclusive o celibato. Jesus foi celibatário, embora esta condição não estivesse de acordo com os costumes hebraicos, e o propõe a outros como uma forma de viver.[26]
O texto onde claramente aparece a proposta especificamente celibatária é o de Mt 19,11-12.[27] Jesus explica que a razão para não contrair matrimônio é “por causa do Reino dos céus”. Isto significa que o “Reino dos céus tornou-se o maior de todos os valores para vários seguidores de Jesus, que, por isso, abandonaram tudo e renunciaram à família. Seguir Jesus não implica apenas acolher a Sua mensagem, mas unir-se a Ele no anúncio escatológico da proximidade do Reino de Deus.[28]
Nesta passagem do Evangelista Mateus, encontra-se um preceito de Jesus sobre o modo prático de viver daqueles que o seguem como norma de vida. D. Marzotto opina que é o serviço ao Reino que ao mesmo tempo conduz à opção celibatária e à consciência da própria vida como um sinal deste.[29]
Por isso, o celibato supõe uma profunda atitude interior de fé em Deus e de abertura aos dons do Espírito, que dá a cada pessoa um dom particular, conforme Paulo expressa em 1 Cor 7,7 (“Quisera que todos os homens fossem como eu; mas cada um recebe de Deus o seu dom particular; . . .”). O homem que acolhe o dom do celibato se apresenta diante de Deus numa pobreza radical: sem nenhum apoio em coisas e em pessoas. É o caso dos Doze (“Eis que deixamos nossos bens e te seguimos! Jesus lhes disse: em verdade eu vos digo, não há quem tenha deixado casa, mulher, irmãos, pais ou filhos por causa do Reino de Deus . . .” Lc 18, 28-30). Deste modo, o presbítero celibatário poderá crescer pessoalmente na fé e gerá-la em outras pessoas.[30]
Assim se estabelece uma relação essencial entre a vida do presbítero e a missão de Jesus e seu projeto existencial: a plena submissão à vontade do Pai para a edificação do Reino de Deus. Paulo VI também vê nesta relação pessoal mais íntima e mais completa ao mistério de Cristo o motivo profundo do celibato (Sacerdotalis caelibatus 54). Eis aí a possibilidade de encontrar o verdadeiro significado da vida celibatária de Jesus, concebido num matrimônio virginal, e a de seus seguidores: para consagrar-se inteiramente ao amor de Deus e das pessoas através do anúncio do Reino de Deus. Jesus não só anuncia o Reino, mas é sinal dele por meio de sua própria vida.[31] Aí também se verifica a dimensão escatolósica do celibato, enquanto sinal do Reino futuro, que virá quando Deus for tudo em todos (1 Cor 15,28).
b) O celibato e o sacerdócio são dois carismas diferentes, mas ligados entre si por razões de conveniência:
Este ponto é o alvo da maioria das críticas contra a obrigatoriedade do celibato para os presbíteros. No entanto, o ministério presbiteral e o celibato são duas vocações, ou dois carismas diferentes. Apesar de não haver nenhuma fundamentação teológica que justifique a ligação entre ambos,[32] contudo estão associados. Mas não unicamente por uma imposição legal, fruto de uma lei canônica. Se esta aconteceu, foi por uma descoberta progressiva, como já está claro tanto pelo aspecto histórico quanto pelo cristológico e escatológico. Por que não afirmar que esta descoberta é fruto da iluminação divina, agindo na vida da Igreja?
A razão apresentada pelo Vaticano II para a ligação entre ambos é que “o celibato se ajusta de mil modos ao sacerdócio” (Presbyterorum Ordinis16). O Papa João Paulo II, na carta aos sacerdotes por ocasião da quinta-feira santa de 1979, volta a reafirmar o mesmo, pois vê o celibato como um dom do Espírito intrinsecamente ligado ao sacerdócio.[33]
A ligação entre estes dois carismas não se encontra no campo da racionalidade, mas no da sabedoria cristã.[34] Por isso, as razões aduzidas a favor da supressão da obrigatoriedade do celibato da Igreja latina (motivos de ordem sociológica, antropológica, teológica ou pastoral) não atingem o cerne do problema. Antes, abordam o sacerdócio unicamente numa perspectiva funcional, esquecendo, portanto, a motivação espiritual.[35]
Estes dois carismas estão em perfeita harmonia com as exigências mais radicais do Evangelho e são assumidos por aqueles que se sentem chamados, pelo impulso do Espírito, a viver estas duas vocações. Evidente que o celibato, assim como o ministério presbiteral, deve ser objeto de uma opção livre e responsável, após madura reflexão e abertura à moção do Espirito. Desta forma, a lei do celibato se acrescentará como uma conseqüência natural da ação divina na vida do homem disposto a seguir radicalmente a Cristo.[36] Isto não significa isenção de dificuldades humanas, mas comporta a necessidade de cultivar o carisma quotidianamente, tornando crível seu testemunho.[37]
K. Rahner, ao concluir sua carta aberta sobre o celibato, expressa a correspondência positiva entre sacerdócio e celibato, possível de ser ainda hoje experimentada.[38]
Não é a lei do celibato responsável pela falta de vocações para o sacerdócio. A experiência das Igrejas protestantes o confirma, porque entre eles também faltam vocações para o ministério de pastor, apesar de poderem-se casar.[39] A vocação ao presbiterato é um dom dado à Igreja e, por isso, esta tem o direito e o dever de fixar as condições para o acesso a ele. E a Igreja Latina prefere correr o risco de perder aqueles que sentem vocação para o sacerdócio e não para o celibato, a fim de não renunciar às vantagens espirituais e pastorais que derivam do ministério presbiteral celibatário.[40]
Diante disto, deve ser frisado que a Igreja, ao unir o ministério presbiteral ao celibato, não está obrigando o candidato ao sacerdócio a renunciar ao matrimônio, porque são duas vocações, ou seja, dois chamados diferentes assumidos dentro do mistério da Igreja, cada um com um significado próprio. Optar pelo celibato por causa do Reino de Deus é uma graça recebida de Deus, e não simplesmente uma lei imposta pela Igreja latina.[41]
c) O celibato proporciona maior disponibilidade para o serviço pastotal e é fonte de caridade pastoral e fecundidade espiritual (dimensão eclesial):
O documento do Vaticano II sobre os presbíteros justifica o celibato apontando-o “ao mesmo tempo como sinal e estímulo da caridade pastoral e fonte peculiar da fecundidade espiritual no mundo” (Presbyterorum Ordinis 16). Outro documento, do mesmo Concílio, aponta-o como meio de serviço aos irmãos com um “coração indiviso”, pois o consagra somente a Deus (Lumen Gentium 42).
O Vaticano II encontra uma fundamentação, ao mesmo tempo, pastoral e mística para o celibato. E. Schillebeeckx é de opinião de que a mística e o apostolado são “dois aspectos ou duas dimensões, recíproca e intrinsecamente ligadas, da única vida de fé cristã”.[42] Isto justifica alguém não casar para poder ficar plenamente livre para o trabalho eclesial. Mas motivação não pode ser apenas o “não casar”, pois o celibato é a efetivação de uma consagração plena ao Reino de Deus.
O celibato assim vivido possibilita ao presbítero uma generosa disponibilidade para as pessoas. Uma família limita as possibilidades de doação às pessoas. É uma disponibilidade não apenas física, mas afetiva e prática. Quem não conhece a atenção que uma família requer, o cuidado necessário a ser dispensado à esposa e aos filhos? Também não se pode exigir que a esposa e os filhos compartilhem os mesmos ideais de doação a Deus e aos irmãos próprios de quem faz uma opção para o sacerdócio celibatário. Assim, o presbítero exerce outro tipo de paternidade e maternidade: o do Bom Pastor.[43]
O celibato não incapacita a pessoa do presbítero para reconhecer as necessidades humanas nem o torna insensível ao próximo, mas o celibato, assumido com amor e como fruto da consagração a Deus, torna-o mais próximo dos outros e sensível aos seus problemas e dificuldades (Sacerdotalis caelibatus 57; O sacerdócio ministerial, Sínodo dos Bispos, 78).
O presbítero celibatário, chamado a uma íntima relação com a pessoa de Cristo, porque é continuador de missão de Jesus, poderá contribuir para a construção da nova humanidade, que encontra na Igreja o lugar de inspiração e concretização. Ele poderá dedicar todas as suas energias e capacidades ao anúncio do Evangelho, aos sacramentos e a tornar a comunidade centro de comunhão, respondendo às suas necessidades espirituais e materiais. Ele congregará a comunidade pela dimensão construtiva do amor, crendo e testemunhando o Deus que é amor.[44]
d) O celibato não é, em primeiro lugar, renúncia ao matrimônio, mas vocação para o amor:
O celibato não pode ser definido negativamente, como se fosse mera renúncia ao matrimônio. Ele não é, em primeiro lugar, renúncia ao amor ou medo da sexualidade e do casamento, muito menos incapacidade para constituir uma família, mas a opção por uma forma de amar diferente da do matrimônio. Jesus Cristo foi celibatário e não renunciou ao amor. Por isso, o presbítero descobre outro amor e assim estrutura o seu projeto existencial, não constituindo família (O sacerdócio ministerial, Sínodo dos Bispos, 73).[45]
O presbítero celibatário opta por amar com radicalidade o Reino de Deus, assumindo com empenho total o estilo de vida celibatária de Jesus, para assim, como Ele, poder dedicar-se exclusivamente ao anúncio do Reino de Deus. Este torna-se o único amor, ou o “amor maior” da vida do presbítero.[46] É por isso que a Presbyterorum Ordinis, n º 16, apresenta o “por causa do Reino dos céus” como a razão para o celibato, evitando, desta forma, qualquer motivação negativa. Portanto, celibato e matrimônio são dois chamados diferentes, que exigem a descoberta e o reconhecimento do dom dado a cada pessoa e a vivência com igual empenho na busca da perfeição.
O celibato só pode ser entendido e vivenciado como fruto de uma escolha por Deus, ou seja, pela difusão de seu Reino e pela comunicação dos frutos da Redenção aos irmãos, por meio de uma dedicação indivisa. A opção celibatária é feita por causa dos valores importantes que comporta este estilo de vida. A lei se acrescenta como resultado e como estímulo à fidelidade nos momentos difíceis, não como ponto de partida. Portanto, como já está dito anteriormente, a opção não é simplesmente pelo celibato em si, mas os valores que ele comporta conduzem à opção celibatária. Para tal acontecer, o presbítero deverá viver numa constante abertura à graça, da qual ele sempre necessitará para poder ser fiel.[47]
Não há oposição entre matrimônio e celibato, mas, ao contrário, enriquecimento recíproco e complementariedade. Celibatários e casados podem ser de estímulo mútuo por meio de urna vocação bem assumida e vivenciada. O celibatário não desconhece os problemas matrimoniais, pois ele, pelo constante contato com casais, adquire condições de ajudá-los. Inúmeras vezes é chamado para tal. O celibatário exerce um serviço ao matrimônio como sinal do amor a Deus, dimensão última do amor humano, ao qual mesmo o amor entre duas pessoas não pode deixar de estar referido. O presbítero, por isso, permanece sinal e testemunho do amor de Deus.[48]
e) O celibato tem um valor perene:
O celibato tem um valor que permanece atual. P testemunho dado pelo celibatário continua válido para os dias de hoje. O Papa João Paulo II afirma que o celibato tem também um grande significado social pelo serviço que presta ao Povo de Deus, pois o presbítero se torna um “homem para os outros”. Mas de maneira diversa daquela que ocorre quando alguém se liga pelo matrimônio a uma mulher. O presbítero é “homem para os outros” no âmbito do Espírito e sua paternidade é universal, pois orientada para toda a Igreja.[49]
J. Sobrino assim entende esta dimensão: “O celibato é, portanto, a tradução histórica de que o Reino de Deus é, na verdade, algo último e possibilita um tipo de seguimento pelo reino. Possibilita um tipo de liberdade estrutural ao serviço do Reino, pois propicia a desinstalação da sociedade; possibilita uma entrega quantitativa aos outros através do vazio efetivo; possibilita viver naquilo que chamamos deserto, a periferia e a fronteira.[50]
O celibato tem um grande potencial de solidariedade, sinal do qual a sociedade técnico-científica de hoje tem necessidade. Esta mesma sociedade produz pessoas incapazes de amar, pois impregnadas de egoísmo ou sem condições afetivas para assumir sua condição e dignidade humana; filhos abandonados, pois há tantos pais incapacitados e impedidos de concretizar sua missão de paternidade e maternidade. Assim, o presbítero celibatário torna-se um testemunho de verdadeiro amor cristão e de esperança para os que não crêem mais que o amor é redentor. Por meio do celibato, ele solidariza-se com todos os que perderam a capacidade de amar ou estão sendo impedidos de uma verdadeira realização afetiva, porque testemunha o amor de Deus como o amor maior e fonte de todo amor humano.
A lei canônica do celibato não abafa a beleza do carisma, pois este é um dom dado pelo Espírito. Ainda mais, porque a pessoa pode renunciar livremente a um direito seu, que no caso é o de casar. Importa, outrossim, que este dom seja assumido com total liberdade e plena consciência, após vários anos de preparação, reflexão e oração.[51]
4. Conclusão
Estas reflexões levam a tirar as seguintes conclusões:
a) O celibato só será bem compreendido dentro do mistério total da Igreja. Isolado, torna-se incompreensível. Alguém poderá achar ultrapassados ou inválidos os motivos alegados pela Igreja a favor da lei do celibato. A Igreja latina considera-o válido ainda hoje e não tem a intenção de mudá-lo, conforme declara o Vaticano II (cfr. Presbyterorum ordinis 16) e Paulo VI (cfr. Sacerdotalis caelibatus 14 e 43).[52]
b) É necessário promover a formação para o celibato. Sem esta, o celibato permanecerá sendo sempre um empecilho para o desenvolvimento harmônico da personalidade e para o exercício da liberdade pessoal, além de possibilitar o contra-testemunho, o que deporia contra o dom de Deus e contra aqueles que assumem este dom com fidelidade. Não é suficiente preparar o candidato ao sacerdócio apenas para o ministério presbiteral. É preciso prepará-lo para uma opção livre e madura pelo celibato e educá-lo para vivê-lo responsavelmente (cfr. O sacerdócio ministerial. Sínodo dos Bispos, 83; Sacerdotalis caelibatus 69). Isto inclui uma verdadeira formação afetiva, pela qual o candidato ao sacerdócio alcance verdadeira capacidade de amor oblativo, encontrando autêntica realização humana e cristã[53], além do equilíbrio físico e psicológico.[54] A recente Exortação Apostólica pós-sinodal Pastores dabo vobis faz a mesma afirmação: “Ora, a educação para o amor responsável e a maturidade afetiva da pessoa tornam-se absolutamente necessárias para quem, como o presbítero, é chamado ao celibato, ou seja, a oferecer, pela graça do Espírito e com a resposta livre da própria vontade, a totalidade de seu amor e de sua solicitude a Jesus Cristo e à Igreja” (cf. Pastoris dabo vobis 44).
c) O celibato continuará sendo sempre uma questão de opção pessoal. O desenvolvimento histórico mostra claramente que nem todos têm capacidade para entender este dom nem optar por ele. Já Cristo, de acordo com o texto de Mt 19,12, previne: “Quem tiver capacidade para compreender, compreenda”. Por isso, antes de perguntar sobre as razões da Igreja ligar ministério presbiteral e celibato, o candidato ao sacerdócio deve questionar-se para ver se reconhece em si próprio, na humanidade e na Igreja, o valor deste carismas.[55] A orientação prudente e sábia do Diretor Espiritual favorecerá a escolha livre feita por amor de Cristo, sem pressão de imposição exterior (cfr. O sacerdócio ministerial, Sínodo dos Bispos, 82; Sacerdotalis caelibatus 72). As críticas e objeções atuais são mais históricas do que existenciais e teológicas, não apresentando alguma novidades.[56]
d) O celibato é também questão de vida espiritual, pois a motivação última será sempre religiosa. O celibato é um carisma dado pelo Espírito e acolhido na fé. Jesus Cristo torna-se, por isso, a fonte na qual o presbítero poderá alcançar o equilíbrio de vida no celibato e o modelo de integração de todas as energias afetivas, enquanto conteúdo do amor presbiteral.[57] K. Demmer afirma que o presbítero, exatamente por isso, deve ter uma “personalidade religiosa”.[58]
Por isso, a Igreja recomenda diversos meios favorecedores da vivencia e da fidelidade ao celibato. Entre esses estão a oração, a ascese, o cultivo de profunda vida espiritual, a disciplina, os sacramentos, a fraternidade sacerdotal, o desenvolvimento integrado da personalidade. Isto, sem esquecer que o celibato é uma conquista permanente, fruto de um trabalho progressivo e incessante, em busca da maturidade humana e cristã.[59]
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NOTAS:
[1] A respeito, ver observação de H. Crouzel, que toma os argumentos de Roger Gryson (Lea origines du célibat ecclésiastique: Do premier au septiême siècle, Gembloux 1970) para extrair outras conclusões: H. CROUZEL, “ll celibato nella Chiesa primitiva” in Sacerdozio e celibato (ed. J. COPPENS), Roma 1975. p. 452. O mesmo contra Schillebeeckx; cfr. H. CROUZEL, “Le ministère: 11 – Témoignages de I’Eglise ancienne” in Nouvelle Revue Théologique 104(1982) p. 746.
[2] Cfr. A LEMAIRE, “Les épitres pastorales:’B. Les ministères dens 1’Eglise” in Le ministère et les ministères selon le Nouveau Testament (ed. J. DEL ORME), Paris 1974, pp. 109-112.
[3] A.VILELA, Le condition collégiale das prêtres au Ille. siècle (Théologie Historique 14), Paris 1981, p. 41.
[4] Cfr. J. QUASTEN, Patrologia. I primi due secoli (1-III), Casale 1983 pp. 543s; C. COCHINI, Origines apostoliques du célibat sacerdotal, Paris 1981, pp. 167-171.
[5] A. VILELA, op. cit., pp. 328s.
[6] G COCHINI, op. cit., pp. 171-176, A. VILELA, op. cit., pp. 41s.
[7] A. VILELA, op. cit., pp. 118-120.
[8] TERTULIANO, De exhortations caritatis 13,4. .
[9] ORIGENES, PG 13, 1595, ID., Fragments sur la Première aux corin
thiens, 34.
[10] M DORTEL-CLAUDOT, ‘’Il celibato nei secoli” in Il prete per gli uomini d’oggi, (ed. C. CONCETTI), Roma 1975, pp. 737s.
[11] C. COCHINI, op. cit., pp. 183-186.
[12] C. COCHINI, op. Cit., pp. 186.194.
[13] C. COCHINI, op. cit, pp. 194-202; J. LECUYER, Le sacrament de I’ordination (Theologie Historique 65), París, 1983, p. 56.
[14] C. COCHINI, op. Cit., pp. 202s.
[15]E. SCHILLEBEECKX, Por uma Igreja mais humana, Paulinas, São Paulo 1989, p. 333.
[16]C COCHINI, op. cit, p. 211. Ver interpretação diferente, no sentido de Nicéia não querer estabelecer uma lei geral de celibato, conforme Elvira: A. J. ALMEIDA, “O celibato dos presbíteros e dos bispos’; in Revista Eclesiástica Brasileira 197(1990/1) p. 148.
[17] Ver exposição a respeito: M. DORTEL-CLAUDOT, op. cit., p. 744
[18] A. M. STICKLER, “Evoluzione della, disciplina del celibato nella Chiesa d’occidente dalla fine dell’età patristica al concilio di Trento” in Sacerdozio e celibato, op. cit., pp. 508-512.
[19] A. M. STICKLER, op. cii, p. 517.
[20] A. M. STICKLER, op. cit., pp. 535s.
{21] P. PALASSINI, “Celibato ecclesiastico”in Dizionario storico religioso (ed. P. CHIOCCHETTA0, Roma 1966, p. 110.
[22] M. DORTEL-CLAUDOT, OP. CIT., P. 752
[23] E. SCHILLEBEECKX, Por uma-Igreja mais humana, Paulinas, São Paulo 1989, p. 334.
[24] IBID., pp. 329-334.
[25] J. AUDET, Matrimônio e celibato nel servizio pastorale della Chiesa, Brescia 1977, pp. 31-47,–A. VILELA, La conditiòn collégiale des prêtres au Ille siècle, Paris 1971, p. 4010; H. CROUZEL, “Celibato e continenza ecclesiastica nella Chiesa primitiva” in Celibato e Sacerdozio (ed. J. COPPENS), Roma 1975, pp. 451-504; ID., “Le ministère dans L’Eglise. Réflexions à propos d’un ouvrage récent. IL Témoignages de L’Eglise ancienne” in Nouvelle Revue Théologique 104 (1992) pp. 745-747.
[26] G. GRESHAKE, Essere preti, Brescia 1984, p. 166.
[27] Não se abordará aqui a questão se o seguimento de Jesus exige necessariamente o celibato, conforme poderia sugerir Lc 14,26 e 18,29 (com paralelos). Sobre esta questão ver D. MARZOTTO, Celibato sacerdotale e celibato di Gestì, PIEMME, Casale Monferrato 1987, pp. 63-115. 0 texto de Mt 19, 11-12 não suscita dúvidas quanto à proposta celibatária e é aceito e usado como tal pelo Magistério (p. ex., declaração Ad Catholici Sacerdotii (20/12/1935) de Pio Xl, n. 49; Menti Nostrae (23109/1950) de. Pio XII, n. 17; Presbyterorum Ordinis 16) e pelos teólogos (p. ex., E. SCHILLEBEECKX, op. cit., pp. 327ss.); A. PENNA, “il carima del celibato nel Nuovo Testamento” in II prete per gli uomini d’oggi (ed. G. CONCETTI), Roma 1975, pp. 707-734.
[28] Esta é também a opinião de J Sobrino: “0 celibato é, portanto, uma tradução histórica de que o reino de Deus é, na verdade, algo último e possibilita um tipo de seguimento pelo reino” (J. SOBRINO, Ressurreição da verdadeira Igreja, São Paulo, Loyola 1982, p. 327).
[29]. D. MA RZOTTO, op. cit., pp. 72 e 74.
[30] Cfr. J. SORRINO, op. cit.,
pp. 326s.
[31] . A. FA VALE, II ministerio presbiterale, Roma 1989, p. 353
[32] A Presbyterorum Ordinis afirma, no n. 16, que o celibato não é exigido pelo sacerdócio “por sua natureza”.
[33] Carta de João Paulo 11 a todos os sacerdotes da Igreja (08/04/1979) n. 8.
[34] Cfr. A. FA VALE, op. cit., p. 343.
[35] É a opinião de M. MARINI, “Celibato e fraternità” in Sacerdozio e celibato, op. cit., p. 895.
[36] Segunda visita de João Paulo 11 ao Brasil, Discurso aos representantes de todo o clero do Brasil, n. 4, in L’Osservatore Romano, edição semanal em português, XXII (42), 20/10/1991, p. 8, A. FAVALE op. cit.,p.345
[37] Favale não nega a humanidade da pessoa do presbítero, mas ao mesmo tempo afirma a necessidade de cultivar o dom do celibato permanentemente (cfr. A. FAVALE, op. cit., p. 346). Por isso, a Presbyterorum Ordinis indica diversos meios para o presbítero cultivar o dom da própria vocação e “ ímplorar a graça da fidelidade” (Presbyterorum Ordinis n. 16; 12 e 13). Paulo VI também reconhece o mesmo, acrescentando que a graça de Deus acompanha aquele que opta pelo celibato: Sacerdotalis caelibatus 48 e 50-52
[38] Cfr. K. RAHNER, Novo sacerdócio, Herder, São Paulo 1968, p. 141
[39]. Ver, p. ex., G GRESHAKE, op. cit, pp. 179s; A. FA VALE, op. cit., p. 348; Sacerdotalis caelibatus 49.
[40]. A. FA VALE, op. cit., pp. 345 e 348; O sacerdócio ministerial, Sínodo dos Bispos, 81.
[41] Assim pensa o Cardeãl Hoftner, nas suas conhecidas dez teses sobre o celibato; cfr. J. Caid. HOFFNER, “Per il regno dei cieli. Dieci tesi sul’ celibato dei preti” in Sacerdozio e celibato (a cura de J. COPPÉNS), pp. 788-790. O mesmo pensa J. LAPLACE, O padre à procura de si mesmo, Loyola, São Paulo 1971,. pp. 62s.
[42] Cfr. E. SCHILLEBEECKX, op. cit., p. 335.
[43] “O sacerdote, mediante o seu celibato, torna-se um homem ‘para os outros’; de maneira diversa de como se torna tal aquele que, ligando-se em unidade conjugal com a mulher, se torna também ele, enquanto esposo e pai, homem “para os outros’; sobretudo no âmbito da própria família; para a esposa, é, juntamente com ela, para os filhos, aos quais dá a vida. O sacerdote, ao renunciar a esta paternidade que é própria dos esposos, procura uma outra paternidade e realmente como que uma outra maternidade, se recordamos as palavras do Apóstolo acerca dos filhos que ele gera com o sofrimento. Esses assim são filhos do seu espírito, homens confiados pelo Bom Pastor à sua solicitude. E tais homens são muitos, mais numerosos do que quantos possa abranger uma família humana” (Carta do Papa João Paulo II a todos os sacerdotes da Igreja, 08 de abril de 1979, n. 8).
[44]. A. FA VALE, op. cit., p. 354; J. SOBRINO, op. Cit., p. 327, Presbyterorum ordinis 4-6.
[45] K Rahner assim escreve na sua carta aberta sobre n celiba to: “Pessoalmente, estou descontente com esta carta, que não esclarece bastante o que existe de fé, esperança, amor a Deus (que é mais do que uma cifra a ser valorizada pelos homens) e aos homens no mistério da renúncia ao matrimônio” (K. RAHNER, op. cit., p. 135).
[46] Assim J. l.aplace expressa a vivência deste amor; ‘Seria necessário provar que o celibato não é um valor de ordem especificamente sobrenatural. É de ordem humana, na medida em que uma pessoa dirige para fim diverso das relações sexuais ou conjugais as energias afetivas que possui. Há causas que cativam a tal ponto a atenção e o coração do homem que, entregando-se a elas, ele se expande inteiramente. Não é a renúncia ao casamento que está em primeiro lugar em seu projeto; é a riqueza e a importância de um amor diferente do amor da mulher que polariza toda a capacidade que o homem tem de amar. É um amor que unifica e dá sentido à existência, diferente do amor sexual e conjugal” (in J. LAPLACE, op cit., p. 62). G. Greshake não concorda com o emprego da palavra ‘’renúncia” –para o celibato, porque não expressa o verdadeiro sentido do celibato enquanto descoberta e opção por outra forma de amar (cfr. G. GRESHAKE, op. cita, p. 168).
[47] Cfr. A. FA VALE, op. Bit., p. 345. João Paulo II assim se expressa: “Fruto de equívoco – se não precisamente de má fé – é a opinião, com freqüência difundida, segundo a qual o celibato sacerdotal na Igreja Católica seria simplesmente uma instituição imposta por lei àqueles que recebem o sacramento da Ordem” (in Carta de João Paulo II a todos os sacerdotes, n. 9).
[48] G. GRESHAKE, op. cit., pp. 169-171.
[49] Cfr. Carta de João Paulo II a todos os sacerdotes da Igreja, 08 de abril de 1979, n. 8.
J. Sobrino aponta o celibato como um exercício da fé que impede a manipulação de Deus e, por isso, tem repercussão social (cfr. 4 SOBRINO, op. cít., p. 326).
[50] J. SOBRINO, op. cit., pp. 328s.
[51] João Paulo II afirma o seguinte: “Todo cristão que recebe o sacramento da Ordem se compromete ao celibato com plena consciência e liberdade, depois de uma preparação de vários anos, uma profunda reflexão e uma assídua oração” (in Carta de João Paulo II a todos os sacerdotes, 08 de abril de 1979, n. 9).
[52] A. Favale opina parecer pouco realista a opinião de que o celibato opcional não prejudicaria o ministério presbiteral (A. FAVALE, op. cit., p. 348).
[53] “0 padre ou o futuro padre corre o risco de acreditar que está resolvida, para ele, a questão do celibato, porque aprendeu a falar, a respeito de Deus e dos outros, a linguagem do amor” (J. LAPLACE, op. cit., p. 67). “Em que estado é mais fácil amar? No celibato ou no casamento? Tem pouca importância a resposta. 0 que se deve saber é que o celibato, tanto quanto o casamento, exige hoje ser vivido cristãmente numa maturidade humana maior que antigamente. Impõe-se, nos dois casos, uma educação” (IBID., p. 70). Favale opina que aquele que é dotado de suficiente maturidade afetiva e de normal equilíbrio físico e psíquico, se é chamado à vida celibatária, com a ajuda da graça, conseguirá dominar as forças dos instintos do corpo, os impulsas do coração e se encontrará em condições de valorizar as suas melhores capacidades (cfr. A. FAVALE, op. cita, p. 347). Por isso a Santa Sé recomenda a necessária formação para a maturidade afetiva e sexual em vista do celibato (cfr. SAGRADA CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CA TÕLICA, Orientações para a educação no celibato sacerdotal, 11 de abril de 1974,29-33).
[54] Sobre isto ver: T. GOFFI, L’integrazione affetiva del sacerdote, Brescia 1968; P. CHAUCHARD, “Celibato ed equilibrio psicologico” in Sacerdozio e celibato, op. cíL, pp. 836-867, S CRUCHON, “Celibato e maturità. L’ora della scelta” in Sacerdozio e celibato, op. cit., pp. 801-831.
[55] J. LA PLACE, op. cit., p. 66.
[56] Sacerdozio e celibato, op. cit., pp. 733s.
[57] “Esse amor só se desenvolve na fé. Se esta desaparece ou diminui, o amor desmorona. Produz-se o desequilíbrio até os fundamentos do ser humano. Os remédios que se procuram, claudicam enquanto vacila a fé. Na realidade é de dois lados, ao mesmo tempo, que se devem considerar as coisas: o da maturidade humana e o da fé. Sem a primeira, a fé vivida no amor do celibato pode ser frágil. Sem a segunda, o desabrochamento do homem no celibato pelo Reino é impossível” (J. LA PLACE, op. cit., p. 84).
[58] “O sacerdote… deve dar conta de si mesmo, por isso requer-se sua competência teológico-espiritual, unida à sua perspicácia no aqui e agora, o quanto possível” (cf. K. DEMMER, ‘Puede vivirse hoy el celibato?” Selecciones de teologia 120 (1991/30) 319).
[59] Presbyterorum Ordinis 16 e 18; Sacerdotalis caelibatus 73-82; SAGRADA CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA, “Orientações para a Educação no Celibato Sacerdotal”, 11 de abril de 1974.