(Revista Pergunte e Responderemos, PR 091/1967)
«Que pensam as próprias mulheres a respeito das possibilidades de receberem a ordenação sacerdotal?»
A revista francesa «SPIRITUS» (29/1966) publicou recentemente as respostas a um inquérito realizado entre vinte vultos femininos a respeito das funções que as mulheres poderiam, para o futuro, exercer dentro da S. Igreja; foram consultadas pessoas de notável projeção social e cultural, de mentalidade aberta, dotadas de conhecimento exato da situação da mulher na sociedade civil e na Igreja de nossos dias.
Vão abaixo transcritos os principais desses depoimentos. O leitor os encontrará classificados segundo o seu conteúdo de modo a formar blocos homogêneos, encabeçados por um título; daí a repetição, sob diversos títulos, dos nomes de certas pessoas interrogadas. Note-se que as pessoas abordadas pelo inquérito não pretenderam (como elas mesmas afirmam) dar respostas propriamente teológicas, mas falaram sobre o papel da mulher na Igreja de acordo com a sua cultura geral e especializada, utilizando conclusões de filosofia, experiências, viagens e principalmente sua fé cristã muito ardente (apenas uma das interlocutoras, Tania Metzel, é protestante, como se verá abaixo). Bom número dos testemunhos assim obtidos se refere de maneira especial às funções das mulheres em territórios de missões. O valor de tais depoimentos provém, em grande parte, de que se derivam de pessoas plenamente devotadas a Cristo e à Igreja, que falaram com aprofundado conhecimento de causa.
Este artigo complementa o que foi publicado em «P. R.» 90/1967, qu. 3 sobre a ordenação sacerdotal das mulheres.
Antes do mais, faz-se mister apresentar
1. As pessoas interrogadas
Ei-las em ordem alfabética:
1) Bénédicte Milcent da redação de «Terre entière». Viveu sete anos na Indonésia como professora de francês do Governo indonésio, colaborando no apostolado dos leigos da Igreja Católica local. Visitou boa parte do SE asiático. Trabalha atualmente no Serviço de Desenvolvimento Rural francês.
2) Ch. Th., do grupo de Madeleine Delbrêl, em Ivry (França).
3) Claude e Denise, das Equipes de Ivry, grupo de leigos oriundo em 1942, ao mesmo tempo que os primeiros núcleos da Missão de Paris e da Missão de França (padres-operários). Tem por finalidade evangelizar o mundo operário. Não é Instituto Secular.
4) Françoise van der Meersch (Irmã Maria Edmunda), das «Auxiliadoras do Purgatório, Diretora da revista «ÉChanges», autora do livro «Religieuse pourquoi?» (Fayiard). Foi consultora religiosa do filme «Eis a serva do Senhor», produzido para a televisão e concernente à vocação religiosa.
5) Françoise de Quercize, Diretora literária e redatora de «Marie-France» . Viveu muito tempo no Marrocos antes da guerra de 1939. Em fevereiro de 1966 passou três semanas na Índia; em conseqüência, pôde (com os leitores de «Marie-France») auxiliar as Irmãs de São José de Cluny a cavar vários poços, que lhes permitiram intensificar a cultura do arroz necessário à alimentação das crianças abandonadas que elas recolhem.
6) Geneviève Gennari, doutora pela Universidade de Paris, romancista («Journal d’une bourgeoise»,
«Les nostalgies» … ), especialista em problemas femininos e ensaísta. Publicou Le dossier de la femme» (Plon) a respeito do feminismo moderno. Colabora com o periódico «Marie-France». Trabalha no Ministério da Juventude, Fez numerosas viagens e um circuito do mundo.
7) Geneviève Honoré, redatora do jornal «La Croix». Fez viagens pela África Setentrional (Algéria, Marrocos) e Ocidental (Camerun, Guinéu, Costa de Marfim, Senegal), pela Jordânia, a Síria, o Líbano, Israel e o Egito.
8) Ghislaine Aubé, primeira Priora Geral das Irmãs do Apostolado Rural, instituídas canonicamente em 1961. O Instituto trabalha em seis dioceses da França, ao lado de Irmãos Missionários fundados pelo Pe. Épagneul.
9) Jacqueline de Boismenu, depois de um ano de estudos nos Estados Unidos e longos anos de preparação, foi uma das primeiras conselheiras agrícolas da França. A partir de 1961, trabalhou no Líbano, na Algéria, na África Central e no Congo; acha-se atualmente no Senegal.
10) Madre Ambroise, Priora das Beneditinas de Vanves (missionárias). Fez fundações em Madagascar, no Vietnam, em Dahomey.
11) Madre Marie de Saint-Ina, das Franciscanas Missionárias de Maria, Missionária na China, de 1940 a 1950; na Indonésia, de 1950 a 1959. Estudou nos E. U. A. de 1960 a 1966 para aprofundar o pensamento chinês. Está preparando uma tese sôbre a cultura chinesa e destina-se à ilha de Formosa.
12) Marcelle Auclair, biógrafa de S. Teresa de Ávila e tradutora das obras da Santa, autora do «Livre du Bonheur». Fêz viagem à China.
13) Marie-Josèphe Beccaria, ex-Secretária Geral da J.E.C.F.; trabalha com uma equipe de sete mulheres (três casadas, três solteiras e uma Religiosa). Realizou em 1966 um inquérito junto a cem mulheres francesas de diversas condições sociais a respeito da mulher na sociedade e na Igreja.
14) Marie-Louise Monnet, fundadora da A.C.I. (Ação Católica Independente) francesa [1], Presidente do Movimento Internacional de Apostolado nos meios sociais independentes (M. I. A. M. S. L), primeira observadora feminina do Concílio nomeada publicamente por Paulo VI no início da terceira sessão. Fez recentemente numerosas viagens: Madagascar, Algéria, Marrocos, Brasil.
16) Ménie Gregoire, autora do livro «Le métier de la femme». Passou na China o mês de março de 1966.
17) Suzanne Guillemin, Superiora Geral das Filhas da Caridade; foi observadora no Concílio.
18) Tania Metzel, protestante. Trabalhou na assistência religiosa aos encarcerados durante quinze anos. Desde 18 de outubro de 1966, é a terceira mulher pastora da Igreja Reformada da França.
Passemos agora à consideração dos depoimentos.
2. Que dizem grandes mulheres?
Os números postos ao lado dos nomes de quem fala, referem ao registro do parágrafo precedente. – Os testemunhos encerram pormenores dos quais é perfeitamente licito discordar; a relação abaixo é feita objetivamente, a título de informação.
1) Ordenação sacerdotal? – Não.
a) Marie-Louise Monnet (14): «Já que Deus criou o homem e a mulher e quis confiar o mundo ao homem e à mulher, Ele quis que haja duas maneiras de ver («deux regards»). Creio que, se o mundo é hoje tão duro, isto se deve a que os homens são os únicos que o consideram e organizam. É preciso que as mulheres tenham seu lugar, o lugar que Deus quis. Mas Deus não quis que a mulher tenha o lugar do homem. Deus quis que ela tenha seu lugar, que ela tenha seu olhar, que ela tenha sua contribuição. Se ela dá uma contribuição de homem, se ela imita o homem, nada se mudará. O homem possui um dom particular para ser chefe, que a mulher não pode contestar. Isto não quer dizer que a mulher não será chefe; todavia ela será chefe com seus dons, que lhe são próprios. Se ela quiser ser chefe com os dons do homem, ela já não será mulher; em conseqüência, o mundo e a Igreja serão prejudicados.
b) Geneviève Honoré (7): «Sou oposta à corrente atual que deseja obter para as mulheres uma participação no sacerdócio, porque creio que isto contraria a natureza feminina. Para mim, a humanidade inteira é oferenda sob o sinal mariano da mulher e é oferecida sob o sinal masculino do padre, representante de Cristo e, mais remotamente, do ‘pater famílias’. Somente Cristo é sacerdote e oferenda. A oferenda é o sinal da mulher; o ofertório é o sinal do homem. A Virgem Maria é não somente a Mulher, mas a Criatura na sua verdade total, como o Criador a quis, oferecida como toda criatura deve ser oferecida (sob o sinal da Virgem e após a Virgem). Isto, porém, não impediu que Cristo tenha fundado a sua Igreja com varões: a Virgem, a primeira criatura em seu coração (quem duvidaria disso?), não estava presente quando na quinta-feira santa Ele disse: ‘Fazei isto em memória de mim’. Ela também não estava presente quando Ele disse: ‘O que ligardes…, o que desligardes,..’».
c) Bénédicte Milcent (1): «Pessoalmente, creio tão profundamente que à mulher compete um lugar complementar na Igreja (lugar ainda não adquirido) que não vejo propriamente por que a mulher seria ordenada. Em última análise, a emoção e o interesse suscitados pela questão da ordenação das mulheres não se derivam, em parte, de uma preocupação exclusiva de igualdade, com tudo que este conceito comporta de arbitrário?»
d) Françoise de Quercize (5): «Se o Santo Padre dissesse de repente que poderão ser ordenadas as mulheres, isto não me surpreenderia; mas também não me surpreenderia saber que tal idéia é rejeitada, pois julgo que a ordenação das mulheres não é indispensável. As mulheres já possuem por si uma função muito grande, primordial. Se elas a cumprirem bem, muito terá sido feito! Não quero dizer que elas se devam simplesmente calar, pois, afinal de contas, a Virgem SS. também teve que falar!, Ademais a mulher já não é sacerdotisa pelo fato de dar ao mundo os que serão padres e criar o ambiente próprio para que se desenvolva a sua vocação?»
«Como dizia o Cardeal Ottaviani, mesmo que eu não compreenda, sigo de olhos fechados o Santo Padre. Mais ainda: é preciso levar em conta o Evangelho e o Cristo. Cada um tem sua função; foi aos Apóstolos, a homens, que Ele deu o poder de O continuar; a Virgem SS. tem outro papel, e parece-me que todas as mulheres devem procurar identificar-se com a Virgem SS.».
e) Jacqueline de Boismenu (9): «Creio que São Paulo nos respondeu com extrema justeza, diria mesmo:.. com humor profético. As mulheres não são iguais aos homens; não lhes compete desempenhar o mesmo papel que os homens. São perfeitamente complementares. Não sei se as mulheres que já amaram um homem, não tomaram consciência de que de fato, apesar de tudo, o homem é o chefe da mulher. Mesmo que uma mulher seja muito inteligente, mesmo que tenha todas as qualidades possíveis, ela acha isso muito natural ou ela não é mulher. Ademais, quem falasse de ordenação das mulheres, renegaria um pouco, a meu ver, a Virgem SS., que recebeu de Deus a mais bela prova de amor, mas que nem por isso se tornou sacerdotisa do Senhor. Não creio que as mulheres tenham sido feitas para segurar nas mãos o corpo de Jesus Cristo a não ser que elas abracem com o coração uma humanidade que tem sede de ternura e necessidade de compreensão. Se as mulheres se põem em vedete, e assumem responsabilidades que se vêem, a quanto me parece, elas não escolhem o lugar que Deus lhes preparou. A ordenação das mulheres me pareceria simplesmente um crime de lesa-feminidade. Graças a Deus! Ainda não somos americanas!»
f) Marie-Josèphe Beccaria (13): «A ordenação das mulheres? Isto levanta tantos problemas que aqueles que se voltam para essa questão, param diante das dificuldades e não vêem o grande caminho que seria necessário previamente percorrer. Com efeito, há problemas mais urgentes, que poderiam ser solucionados de pronto, com poucas transformações, desde que houvesse o mesmo querer da parte da hierarquia, dos sacerdotes e das mulheres.
g) Ghislaine Aubé (8): «Sempre digo a mim mesma que a questão da ordenação das mulheres poderia ser de novo estudada. Mas há fatos inegáveis: a situação social dos tempos de Nosso Senhor (com a sua mentalidade própria) e dois mil anos de Cristianismo. Esses fatos parecem-me algo de consistente.
2) Ordenação sacerdotal? – Questão prematura
a.) Marie de Saint-Ina (11): «Por certo, contra a ordenação das mulheres não se encontra argumento nem no Evangelho nem do ponto de vista teológico. Mas, antes que a mulher possa realizar essa função, creio que será necessária longa preparação, não somente preparação imediata, mas preparação social. Digamos que na hora atual a Igreja aceite a ordenação das mulheres; julgo que a sociedade e o mundo em seu conjunto não seriam capazes de a receber. O público ainda não admitiu a mulher – não diria como idêntica ao homem, pois este é justamente o erro das nossas sociedades: querem tornar a mulher idêntica ao homem -, mas o público ainda não considera a mulher como igual ao homem, de modo a poder realmente admitir, respeitar e receber uma mulher sacerdotisa».
«Igual», no texto acima, parece ter o sentido do adjetivo «complementar».
b) Marcelle Auclair (12): «A ordenação das mulheres? Ainda não chegamos a tanto. É preciso primeiramente dar à mulher consciência da sua personalidade como tal».
c) Ghislaine Aubé (8): «Conheço uma socióloga que diz: ‘Como quer que seja, não se deveria pensar nisso (a ordenação das mulheres) senão daqui a duzentos anos…’ Por isto, tais discussões me recordam as dos teólogos de outrora (medievais) que disputavam sobre o sexo dos anjos! São reflexões interessantes talvez; contudo elas me parecem um pouco aéreas enquanto não realizamos as tarefas que pedem imediatamente a nossa intervenção. A vantagem de tais reflexões é talvez a de nos chamar a atenção para uma série de incumbências que desde já seriam possíveis para as mulheres… na Igreja Católica».
d) Françoise van der Meersch (4): «Já me propuseram algumas vezes essa questão (da ordenação das mulheres). Confesso que não me detive sobre ela, porque me parece que no momento presente não está em absoluto madura. O ponto de vista teológico, não o conheço. Creio que não há oposição irredutível; o que existe, é apenas um costume tradicional na Igreja: esta nunca conferiu as Ordens às mulheres. Que decidirá a Igreja no futuro? Não o sei. Julgo que Ela não poderia resolver transformar sua praxe antes que a condição feminina tenha mudado de maneira muito mais universal e fundamental do que em nossos dias».
3) Os precedentes protestantes
a) Ghislaine Aubé (8): «O protestantismo não considera o sacerdócio do mesmo modo que nós, embora a sua atitude concernente à ordenação das mulheres não me cause dificuldades. É preciso levemos em conta também a posição dos ortodoxos diante desse problema. Nós nos separaríamos deles se tomássemos a outra direção»).
Sabe-se que os orientais cismáticos («ortodoxos») não conferem o sacramento da Ordem às mulheres; poderiam distanciar-se mais dos católicos se estes mudassem a sua praxe neste particular.
b) Tania Metzel (18): «Entre nós (protestantes), a pregação pode ser confiada a leigos, sem que para isto precisem de delegação pastoral. A delegação pode-lhes ser dada em certas circunstâncias – por exemplo, quando se trata de substituir um pastor – para distribuir a Santa Ceia ou celebrar um Batizado. Para nós, o ministério pastoral não é nem um sacramento nem uma ordem. É uma função ou, antes, o reconhecimento, por parte da Igreja, de uma vocação.
Depois de se ter certificado da formação e da capacidade do candidato, a Igreja reconhece que Deus dirigiu uma vocação à pessoa que Ela destina piara o ministério. Se bem que a ordenação não seja para nós um sacramento, ela é um ato importante na vida da Igreja.
Reunimo-nos para invocar o Espírito Santo, impor as mãos a um servo de Deus e orar conjuntamente…»
4) Serviço ou «diaconia» na Igreja, sim!
a) Marcelle Auclair (12) : «Eu não pediria, para as mulheres, a ordenação sacerdotal. Mas, se lhes fosse concedido pregar de vez em quando, teria grande prazer. Uma mulher que realmente tem fé e vive sua vida cristã, encontraria, estou convicta, a dizer muita coisa de real utilidade para o público em todos os setores, tanto no espiritual como no temporal – nesse setor temporal, sim, que está muito mais ligado ao espiritual do que imaginam aqueles que vivem com a sua fé numa gaveta, e a sua vida cotidiana em outra gaveta».
b) Bénédicte Milcent (1): «Que as mulheres recebam as ordens sacras? Não aprofundei vitalmente a questão. Apenas posso dizer que, intuitivamente, isto não é algo que me interesse muito ou que me apaixone. Ao contrário, creio que o que devemos procurar é um lugar de muito maior responsabilidade, muito maior definição para a mulher, lugar em que a mulher seja escutada, em que contribuição seja reconhecida, admitida, estimulada. Ainda não chegamos a tanto!»
c) Françoise van der Meersch (4) : «Será preciso permitir, em nossos países ocidentais, certa colaboração feminina em obras que até o presente são executadas apenas por homens celibatários. Quais são as Religiosas que penetram na organização pastoral das dioceses? Quais são as Religiosas consultadas quando se trata do trabalho pastoral, mesmo na paróquia? Esse trabalho é organizado pelo clero com muita generosidade e habilidade em três quartos dos casos, não o nego. E é imposto às Religiosas; mais raramente é-lhes proposto, e ainda mais raramente se lhes solicita que sobre ele reflitam juntamente com o clero da paróquia».
d) Marie-Josèphe Beccaria (13) : «Não pedimos em absoluto que os problemas femininos sejam considerados como uma entidade ou um mundo à parte. Isto é perigoso e, afinal, muito prejudicial à mulher. Havia outrora um ‘slogan’ nos Movimentos de Juventude que rezava: ‘Não há problema juventude, há apenas um aspecto juventude de problemas gerais’. Seríamos tentados a dizer analogamente: `Não há senão aspectos femininos de problemas gerais’».
e) Claude e Denise (3) : «A ordenação sacerdotal das mulheres? Preferimos perguntar: será que, na medida em que o laicato tomar seu lugar na Igreja, não haverá uma série de funções de administração ou mesmo de governo que poderiam ser tão bem exercidas por leigos, homens e mulheres, como por presbíteros? »
5) Os grandes predicados da mulher
Após falar sobre as possíveis funções da mulher na Igreja, os depoimentos põem em foco as qualidades que o sexo feminino apresenta ao serviço de Cristo e da Igreja.
a) Marie-Louise Monnet (14): «Quando o homem é generoso, é formidavelmente generoso; mas a mulher possui uma generosidade que, creio, é particularmente perseverante. Ouvi o Santo Padre dizê-lo, quando recebeu os observadores e as observadoras no fim da terceira sessão. Falando principalmente das observadoras, disse algo que não foi publicado, mas que me impressionou: ‘Quando a mulher se empenha, ela vai até o fim’. Bem se vê isto nos lares … Isso beneficia também as missões. No Brasil, falei com muitas Religiosas missionárias: vi algumas que lá estavam havia trinta ou quarenta anos, vivendo em regiões onde não teriam podido agüentar se não possuíssem amor à vida corriqueira das pessoas com quem viviam. E quarenta anos não lhes pareciam muito tempo! »
b) Claude e Denise (3): «Pensamos também em experiências realizadas por homens leigos, os quais tentaram a vida que levamos e que, a meio-caminho, desistiram. Eles talvez precisem mais de construir, de ver os resultados da sua construção, ao passo que nas missões não vemos nada disso. Talvez as mulheres aceitem mais fàcilmente essas condições.
c) Suzanne Guillemin (17): «É a mulher quem dá à Igreja a sua nota universal de ‘atenta aos pobres, aos doentes, aos desfavorecidos’. Em geral, é pela mulher missionária, pela Religiosa missionária que se difunde esse aspecto da Igreja, … da Igreja posta a serviço dos desprotegidos».
d) Françoise de Quercize (5): «A mulher, instintivamente, sabe atender aos que sofrem; é certo que, num caso de dor moral, a mulher geralmente sabe falar melhor, sabe melhor do que o homem, dizer a palavra oportuna.
e) Ch. Th. (2): «Madéleine Delbrêl, em seus últimos anos de vida, atribuía importância cada vez maior à bondade… A bondade de um coração convertido a Cristo é como um pressentimento da bondade de Cristo, do amor de Cristo. Ora a bondade feminina é um pouco diferente da bondade masculina; elas se completam mutuamente».
f) Marie-Térèse Cheroutre (15): «Receio seriamente, quando a mulher se quer identificar com o homem projetando-se nas mesmas formas que ele. O homem tende a instaurar ordem no mundo; a mulher tende a estabelecer relações e a dar notas humanas ao mundo. É este um aspecto essencial da sua vocação profunda. Tal foi a Mãe do Salvador: a medianeira, a intermediária. Em todas as circunstâncias da sua vida, quaisquer que sejam as suas funções, qualquer que seja a sua situação social, é preciso que a mulher seja, no coração do mundo, a testemunha de que o amor é fundamental».
g) Geneviève Honoré (7): «Eu muito desejaria que se sublinhe quanto a maternidade, que caracteriza a mulher, não é apenas uma maternidade biológica, mas maternidade em relação a todos os setores da vida. Segundo vejo, nada toma corpo a não ser aquilo a quem a mulher tenha dado corpo».
h) Marie-Louise Monnet (14): «A mulher possui uma compreensão íntima das pessoas, compreensão de que o homem não é dotado no mesmo grau, seja ele o sacerdote mais eminente e mais missionário. Para penetrar profundamente na psicologia do povo com o qual vivemos, temos que passar muito tempo a considerar uma infinidade de minúcias; ora isto é mais difícil para um homem. A mulher se interessa pela vida mesma. Consequentemente, pelo fato de estar em intercâmbio com outras vidas, ela dá atenção aos mais simples pormenores.
i) Bénédicte Milcent (1): «Na sociedade moderna industrializada – e urbana – a mulher, e mais particularmente aquele que em sua fé se nutre do Evangelho, terá cada vez mais uma função própria. Ela pode ser o elemento pacificador, o elemento que amaina os choques e a agressividade, aquela que relaxa com amor ou gentileza uma situação tesa, complexa. Apesar de ter os nervos frágeis e muitas vezes afetados pelas condições pouco sadias da vida moderna, a mulher possui, mais naturalmente do que o homem, o senso do relativo, o gosto da harmonia, da paz, da continuidade, e o espírito industrioso que serve a esse gosto».
j) Madre Ambroise (10) : «O homem, por seu próprio gênio, é criador. Por conseguinte, é, para ele, muito mais difícil não propor suas idéias, não fazer algo. A mulher, ao contrário, suporta, alimenta, tolera, gera… Por isto é, para nós (mulheres), quase mais fácil respeitar os povos aos quais nos dirigimos nas missões. Há homens missionários que o conseguem; isto é admirável, mas, para eles, resulta muito menos natural».
k) Marie de Saint-Ina (11): «Não somente a mulher tem oportunidades de poder desabrochar sua vocação de mulher na vida missionária…, diria mesmo que a obra missionária não se poderia realizar sem a mulher. O elemento feminino é, por excelência, o elemento que recebe os outros, que tem consciência de estar presente para servir aos outros, elemento que é aceitação, acolhimento dos outros e que, justamente por essa capacidade de acolher, pode chegar a penetrar os outros, a compreendê-los, eu diria… quase à semelhança da água. Para que se faça trabalho missionário, é preciso, antes do mais, que haja penetração; se não, a ação se torna superficial, de certo modo estranha àqueles que desejamos atingir. Chegar em um país de missão com um conjunto de idéias preconcebidas, de planos pre-traçados, e dizer: ‘Hei de fazer isto, hei de organizar aquilo’, não parece ser o método adequado. É preciso proceder devagar, com leveza, para penetrar as personalidades no que elas têm de profundo. Laotsé dizia: ‘A bondade, quanto mais se eleva, tanto mais se parece com a água; ela penetra tudo sem luta… mesmo os lugares mais desprezados pelos homens…’. Estas palavras estão prenhes de riqueza missionária e de riqueza feminina… ; ficar em silêncio, trabalhar mais pelo olhar do que pelo ativismo… fazer como a água; nada impor a não ser o enriquecimento, a fecundação do que já existe, eis (a quanto me parece) a verdadeira fórmula… Evidentemente, não se trata de permanecer sempre na consideração das coisas,… mas é preciso nunca esquecer o primado da consideração, da ‘penetração’ semelhante à da água!»
Como fecho, segue-se mais um depoimento de Marie-Louise Monnet, que resume várias das idéias até aqui manifestadas, deduzindo das mesmas uma conclusão de grande valor.
A primeira coisa a fazer é talvez educar a mulher, mesmo a dos meios independentes [2], para que ela se liberte, para que assuma sua maioridade. Pois assumir a maioridade na Igreja é muito belo, mas muitas não têm sequer idéia do que é ‘ser mulher’ e ‘ocupar todo o lugar respectivo à mulher’. Quando uma mulher tem a graça, a possibilidade, a coragem de ocupar todo o seu lugar, então que ela o ocupe! A Igreja só pede isto. Pessoalmente, nunca achei que ‘tomar iniciativas na Igreja’ era algo de incômodo e, enquanto me lembro, não fui impedida de as tomar. Mas creio também que é preciso que cada qual saiba coordenar o que faz com o que os outros fazem; creio também que é mister levar em conta que, na Igreja, há uma autoridade que é primacial e à qual nos devemos submeter».
Estas sábias palavras sirvam de encerramento às considerações propostas nas páginas anteriores!
NOTAS:
[1] «Ação Católica Independente» é a que se faz entre as pessoas que não dependem do exercício de alguma profissão para viver.
[2] Os «meios independentes» significam as pessoas que não dependem do exercício de alguma profissão para viver.